*Por
Luiz Antonio Domingues
Instalada
na Rua Santa Cruz, próxima à Estação Santa Cruz do Metrô de São Paulo,
encontra-se a Casa Modernista.
Trata-se
de um equipamento cultural importante da cidade de São Paulo, aberto à
visitação pública, gratuitamente.
Gregori Warchavchik imagem do arquivo da família |
A
relevância de tal museu arquitetônico é justificada pelo fato dessa construção
ser considerada a primeira no estilo modernista, erguida no Brasil. Sua
concepção foi de Gregori Warchavchic, um arquiteto ucraniano, nascido na cidade
de Odessa, em 1896.
Warchavchic
estudou na Universidade de Odessa e concluiu sua graduação no Real Instituto de
Belas Artes de Roma, no ano de1920.
Em
1923, surgiu a oportunidade de ir trabalhar num exótico país tropical da
América do Sul, chamado Brasil...
Chegando
aqui, seu primeiro trabalho foi numa construtora sediada na cidade de Santos,
litoral de São Paulo.
Nessa
companhia, considerada moderna para os padrões da época, as edificações tinham
caráter leve, trazendo conceitos novos dentro da arquitetura e certamente foi
terreno propício para que Gregori Warchavchic pudesse sentir-se livre para
criar, rompendo com conceitos obsoletos. Seguindo os propósitos do modernismo
instaurado após a Semana de Arte Moderna de 1922, lança um manifesto de
arquitetura modernista em São Paulo, no ano de 1925.
No
mesmo ano, estabelece amizade com o arquiteto Lucio Costa e torna-se professor
na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Sua
carreira como professor foi curta, mas sua fama de bom professor ficou
registrada através de muitos alunos que posteriormente declararam a importância
de Warchavchic como influência em suas respectivas carreiras.
Em 1927, projeta
sua residência na capital paulista, que é construída finalmente em 1928.
Considerada
a primeira construção modernista do Brasil, a Casa Modernista impressiona pelas
linhas arrojadas, conceitos de iluminação e ventilação, muito interessantes,
destoando completamente das habitações padrão dos anos vinte do século passado
em São Paulo e todo o Brasil.
Convidado
por Le Corbusier, torna-se representante sul-americano dos CIAM (Congressos
Internacionais de Arquitetura Moderna).
Gregori
casou-se com Mina Klabin, filha de imigrantes do leste europeu e o casal
habitou a casa da Rua Santa Cruz. Mina Klabin foi responsável pelo paisagismo
do amplo jardim, implementando diversas espécies tropicais, garantindo assim o
frescor da moderna habitação.
Claro,
forças obtusas não se conformaram com tal ousadia arquitetônica e não foram
poucas as críticas irônicas perpetradas pelos retrógados de plantão, reação
esperada, como sempre.
A
casa é desprovida de ornamentações e para obter a aprovação da prefeitura para
o projeto, Warchavchic teve que apresentar um projeto falso, com linhas
arquitetônicas tradicionais. Posso imaginar a estupefação de um ucraniano
diante do "jeitinho brasileiro" e naquela época onde a austeridade
era muito maior nos costumes...
Hoje,
Warchavchic não teria dificuldades de obter materiais no mercado, mas naquela
época, sofreu ao deparar-se com a falta de componentes industrializados, tais
como maçanetas, placas, tintas e ferragens em geral. Queixava-se também do alto
preço cobrado para materiais básicos como cimento, cal, areia e sobretudo por
não encontrar mão de obra especializada. A burocracia da prefeitura e essas
dificuldades atrasaram a obra, mas mesmo com esses empecilhos, conseguiu
construir e habitar a bela residência.
Família Klabin-da esquerda para a direita, os filhos: Jenny (nascida em 1898), Luiz (1900), Mina(1896) e Emannuel (1902). Bertha Osband (em pé) e Maurício Klabin. Foto da reportagem – O Klabin “pobre” – da Gazeta Russa. Segundo a reportagem, a foto pertence à “Coleção Gregori Warchavchik Fonte Bibliográfica: Aquino, Paulo Mauro Mayer de (org.). Gregori, Warchavchik – Acervo Fotográfico vol.I e vol.II, São Paulo, edição Família Warchavchik, 2005 e 2007 |
Nos
anos 1940, a residência passou por modernizações. Mina Klabin refez a
jardinagem, plantando muitos eucaliptos. Segundo se conta, o objetivo era
resguardar a privacidade da residência, diante do fato de um hospital de grande
porte estar sendo construído como vizinho. Era o Hospital Nipo-Brasileiro, que se
erguia, fruto dos esforços de mutirão da imensa colônia japonesa residente em
São Paulo.
Mas
existem registros de certas hostilidades, além da privacidade ameaçada, visto
que os japoneses e os judeus estavam em conflito por conta de suas respectivas
posições antagônicas, durante a II Guerra Mundial.
E
uma oficina de gasogênio foi instalada na garagem, pois com o racionamento de
combustíveis, essa parecia ser uma alternativa para abastecer os carros da
família.
Warchavchic faleceu em 1972 e a família ainda
residiu ali por algum tempo, até que decidiram vender a propriedade.
Vendida em 1983, para uma construtora, o objetivo
era demoli-la impiedosamente para a construção de torres residenciais.
Mas os moradores do bairro mobilizaram-se e nessa
pressão popular, o Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico,
Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo), tombou a Casa
Modernista. Claro, iniciou-se uma guerra jurídica que se arrastou até 1994,
quando finalmente o Estado de São Paulo foi obrigado a pagar pela casa, tornando-a
seu equipamento de uso cultural.
Casa Modernista – Vista do quintal (Foto: Paulo Ciclista) |
Eu recomendo a visitação. É uma bela construção e
hoje em dia, um refúgio refrescante para descansar em meio à agitação do
bairro.
Fica muito próximo também ao Museu Lasar Segall,
outro centro cultural agradabilíssimo, da Vila Mariana, zona sul de São Paulo.
A Casa Modernista abre de terça a domingo, das 9:00
h às 17:00 h, com entrada gratuita e com possibilidade de visita monitorada, se
desejar.
*Texto de Luiz Antonio Domingues (músico das
bandas PEDRA,Ciro Pessoa & Nu Descendo a Escada, Kim Kelh e os
Kurandeiros)-(Orra Meu!).
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