domingo, 29 de janeiro de 2012

DE OVELHA A CABRA CEGA


Em 1961, cismado com a justificativa de soldados nazistas acusados de crimes de guerra e contra a humanidade de que apenas cumpriam ordens, o psicólogo americano Stanley Milgram realizou um impressionante experimento científico, recentemente repetido pelo diretor, roteirista e produtor de cinema Eli Roth, para o Discovery Chanel.
Um ator, representando um cientista e outro ator representando um estudante universitários, e um terceiro elemento recrutado em troca de algum dinheiro colocavam-se num laboratório. Ao voluntário era dada a alternativa de recusar-se a continuar em sua função a qualquer momento. Era simulado um sorteio em que o ator-estudante sempre tirava o papelzinho que lhe dava a condição de inquirido e ao voluntário a função de entrevistador. Os três iam a uma sala contígua ao gabinete do professor e o aluno era preso a uma cadeira e colocado ao alcance de sua mão uma switch com interruptores.
A sala era fechada e o entrevistador era levado à sala do professor e colocado diante de um aparelho com diversos interruptores. Ele era orientado a fazer perguntas ao aluno, através de um microfone e a cada erro em suas respostas o entrevistador deveria aplicar-lhe um choque elétrico em ordem crescente de 15 volts, começando por 15 volts e podendo chegar a 450.
Não havia choque, apenas uma simulação e somente o entrevistador não sabia disso. Eram perguntas simples, típica de psicotestes, como, por exemplo: “Qual a palavra que não faz parte da sequência? A) gato; B) ovelha; C) cavalo; D) elefante; E) cadeira”. Até a terceira pergunta o aluno respondia corretamente, a partir daí começava a cometer erros.
Ao começar a dar choques, não havia desentendimento, mas, na média, ao se chegar a uma carga de 150 volts, momento em que o estudante gritava que tinha problemas cardíacos e começava a sentir incômodos no coração, os entrevistadores começavam a recusar-se a continuar. O cientista, então, dizia que havia a necessidade de se continuar com o procedimento. Sem pressão, apenas com firmeza, laconicamente o cientista dizia “continue” e 75% dos voluntários, mesmo desconfortavelmente, continuavam. A cada choque, a partir dali, o aluno soltava um grito pelo auto falante e pedia para ser retirado enquanto que o cientista insistia “continue”.
Alguns entrevistadores caíam em lágrimas, mas continuavam, até que o aluno deixava de gritar ao chegar aos 400 volts.
A experiência era interrompida, o verdadeiro cientista entrava na sala e explicava ao voluntário do que se tratava. Perguntava, então, ao voluntário por que ele havia continuado a martirizar o aluno mesmo contra sua vontade. A maioria das respostas era que o “cientista” havia ordenado, comprovando que os soldados nazistas não fugiam à regra de qualquer outro cidadão, naquilo que eu chamo de “efeito ovelha”, que segue a trilha que o pastor manda sem questionar-se sobre as conseqüências das ordens dadas.
Generalizando as comprovações desses experimentos, vejo este comportamento repetir-se em todos os grupos estatutários. Clubes de serviço, escolas, repartições públicas, partidos políticos... Via de regra, o cidadão não questiona as ordens. Entenda-se por questionar, procurar saber as razões e não opor-se, como pode parecer aos menos afeitos à significação das palavras.
Ao receber uma ordem ou uma palavra de ordem, os cordeirinhos a cumprem sem procurar saber das conseqüências. A militância política tem esse espírito. Acompanhar o rebanho dá menos trabalho do que perguntar-se se este está sendo conduzido a um pasto verde e seguro ou ao matadouro.
Palavra de líder termina sendo mais pétrea do que as determinações da lei para quem não se garante como ser pensante, transferindo às autoridades todas as obrigações de determinação de seus atos.
Esta cegueira coletivizada leva aos desmandos sem oposição. Se a autoridade eleita diz para se fazer, faz-se, se diz para gritar contra isso ou aquilo ou favor deste ou daquele companheiro, grita-se. Se ordena que obedeça, obedece-se. Se mandar que se cale, o silêncio impera. Pior, isto acontece de todos os lados, seja no da situação, seja no meio cego de uma oposição incipiente como a que vemos hoje no Brasil.
Nos tornamos carneirinhos na mãos de maus pastores.
Marcos Pontes

Nenhum comentário: