sexta-feira, 2 de novembro de 2012
AUGUSTO DA CUNHA GOMES - PARTE I
Hiram Reis e Silva, Porto
Alegre, RS, 02 de novembro de 2012.
Reportamos, neste artigo, a primeira
parte da Re-exploração do Rio Javari chefiada pelo Capitão-Tenente Augusto da
Cunha Gomes, nomeado pelo Ministro das Relações Exteriores, General Dyonizio de
Cerqueira, em 1898, com a finalidade de descobrir-lhe a verdadeira.
- Limites Entre o Brasil e a Bolívia
Re-exploração do Javari
Comissão de Limites· entre o Brasil e a Bolívia.
Manaus, 11 de Janeiro de 1898.
Ao Sr. General Ministro das Relações Exteriores.
Tenho a satisfação de submeter à vossa consideração os principais
resultados dos trabalhos de Re-exploração do Rio Javari, a que procedeu a
Comissão de Limites entre o Brasil e a Bolívia, de conformidade com a vossa
autorização, exarada em telegrama sob n° 539, de 23 de maio do ano passado, e
de apresentar-vos dados e informações suficientes, afim de que possais formar
opinião segura a respeito dos serviços executados em quatro meses de trabalho,
posições geográficas, clima, constituição geológica, riquezas naturais, etc.
etc.
Em 8 de Abril recebemos do Sr. Governador deste Estado o telegrama
seguinte, a ele transmitido por intermédio do Sr. Dr. Governador do Estado do
Pará:
Rio, 27 Março.
Governador Estado.
Peço que comunique o seguinte a
Cunha Gomes, membro da Comissão de Limites com a Bolívia, onde estiver:−
Preciso saber com urgência pelo telégrafo que providências e recursos são
necessários para se fazer já Re-exploração do Javari.
(Assinado) Ministro Exterior.
Em vista da urgência da pergunta, respondemos neste mesmo dia com o
seguinte telegrama:
Para Re-exploração Javari já,
preciso aviso Tocantins pertencente flotilha Amazonas, contingente 40 praças,
um oficial, sessenta contos para compra seis canoas, conserto batelão, sustento
força e custeio Expedição.
Em cumprimento, portanto de todas as vossas ordens e sem perda de tempo,
procuramos organizar a Expedição com os recursos indispensáveis para levar a
efeito tão difícil quão honrosa Comissão.
Não dispondo do Destacamento posto à disposição desta Comissão, por terem
seguido por ordem do comando desta guarnição as praças que o compunham e que
pertenciam ao 35° Batalhão de Infantaria, requisitei do Sr. Capitão Dr. Manoel
Uchôa Rodrigues, então seu Comandante interino, pessoal que o pudesse
substituir, tendo, em resposta me comunicado essa autoridade somente me poder
dispensar 10 praças, porquanto o 36° Batalhão de Infantaria estava já muito
desfalcado de pessoal.
Resolvi então aproveitar o oferecimento espontaneamente feito pelo Dr.
Fileto Pires Ferreira, atual Governador deste Estado, o que vos comuniquei em
ofício sob n° 17, de 10 de Junho. (...)
O aviso Tocantins, do comando do Capitão-Tenente Raimundo José Ferreira Vale,
posto à disposição da Comissão, lancha Taruman, cedida sem pessoal pelo Dr.
Governador do Estado, um batelão pertencente à Comissão e seis canoas compradas
para este fim.
Foi todo o· contingente municiado para uma viagem de cem dias, sendo os
pedidos feitos pela tabela em vigor na nossa Marinha de Guerra.
Levou também a Comissão os instrumentos necessários e indispensáveis a
serviços desta natureza, bem como uma ambulância e dietas suficientes para
atender às necessidades de todo o pessoal.
Aspecto Geral dos Rios “Solimões”,
“Galvez” e “Javari”
Preparados para admirar as belezas do Rio Solimões e contemplar essa
natureza, tão poeticamente descrita em trabalhos científicos de sábios e
viajantes notáveis, partimos para, pela primeira vez, empreender uma viagem às
regiões banhadas por este Rio, tão acertadamente denominado — Rio-Mar .
A vastidão dessa enorme quantidade de água doce, que parte dos Andes, muito
próximo do grande Oceano Pacífico, e que, atravessando a América do Sul na sua
maior largura, permite a saída dos produtos de cinco Repúblicas, por meio de
seus tributários sem número, impressiona no primeiro momento o espírito mais
prevenido, porém a sucessão por dias e dias, dessa interminável faixa de
terras, as mesmas margens, mais ou menos inundadas, trazem a monotonia ao
espírito, e o que a princípio impressionou, se transforma finalmente em
aborrecimento.
Mesmo, o encontro em uma e outra margem de antigas Vilas florescentes, hoje
cidades, não interrompe a monotonia da viagem. Perdida para elas a vida que
outrora tinham apresentam hoje esses pontos comerciais do Rio Solimões um
aspecto triste, que se transmite ao passante; e condenadas pelo de envolvimento
comercial da Capital do Estado só uma ou outra casa de melhor aspecto atesta a
sua antiga florescência, acentuando a sua decadência atual.
Tudo muda ao entrar-se no Rio Javari. Aproximando-se suas
margens, logo acima da Foz, tomam proporções e formas, que são mais agradáveis,
deixando ver uma vegetação mais vigorosa, revestida de cores próprias à mata
virgem.
Suas margens já formadas de barrancas altas e muito povoadas, até a Boca do
Rio Itecuai, um dos seus mais importantes e poderosos tributários da margem
direita prestam atrativos, que em vão se procuram no Solimões.
A navegação do Rio Javari é feita atualmente com regularidade até o povoado
Santa Cruz de Itecuai ou “Remate de los
Males” — situado na Boca do Rio Itecuai. Na época da cheias vão alguns
vapores até a Boca do Rio Curuçá, afluente não menos importante da sua margem
direita.
Daí em diante, só é navegável por lanchas a vapor em toda a época do ano
até a Foz do Rio Galvez, afluente da sua margem esquerda.
A Companhia de Navegação a vapor Amazonas Limitada e algumas casas
importantes de Manaus e Pará, mantêm um serviço regular até o primeiro destes
afluentes.
A 377 milhas da Foz do Javari finda a navegação a vapor e entra-se na zona
de difícil trânsito. É na confluência do Rio Galvez com o Javari. Este segue
então com o nome de Jaquirana até as suas nascentes.
Em agosto, quando começam as chuvas e trovoadas no Alto-Jaquirana,
principiam as chuvas do Rio Javari, promovendo em Setembro os primeiros
repiquetes, vindos das cabeceiras.
Em novembro a enchente está francamente em ação, crescendo as águas
constantemente até atingirem seu máximo de 10 ou 12 metros, em média, entre a Boca
do Javari e a do seu afluente Galvez. Daí em diante, as águas sobem mais,
devido a menor largura do Rio, chegando, em média, a 15 metros entre os Rios
Galvez e Batã ou Paissandu.
Do Batã em diante, a altura das águas varia em extremo, subindo em alguns
pontos até 10 metros, devido à forma das curvas do Rio e aos obstáculos
encontrados no seu leito. As chuvas diminuem em março e cessam em abril.
Em julho a máxima vazante se manifesta em todo o Rio Javari e sua
continuação, o Jaquirana. Nesta estação, que dura três meses, a profundidade
mínima do Rio Javari, da sua Foz à do Galvez, é de 1,83 m, principalmente nos
bancos e coroas de areia, que são mudáveis em cada cheia, e no ponto denominado
— Cachoeira.
A maior velocidade das águas observada neste trecho foi de 5 milhas por
hora, em meia vazante, sendo quase insensível no princípio. Até o Galvez foi a
viagem feita em vapor dai em diante em canoas entrando-se pelo Jaquirana.
Se é agradável e relativamente cômoda a viagem a vapor pelo Javari até o
Galvez, duplamente fatigante, trabalhosa e cheia de peripécias é a subida em
canoa pelo Rio Jaquirana ou Alto-Javari nesta época do ano, isto é, durante a
sua máxima vazante.
Rio Galvez
É o Rio Galvez o afluente do Javari que mais ocupou a atenção das Comissões
Mistas de Limite entre Brasil e o Peru, que exploraram este Rio nos anos de
1864 e 1874, bem como do Governo Brasileiro pela controvérsia, quanto a ser ele
ou não a continuação do Rio Javari.
Faz o Galvez junção com o Javari no ponto cujas coordenadas são:
— Latitude: 5°10’17,5” Sul.
— Longitude: 72°52’29” Oeste Gw.
— Altitude: 101,6 metros.
Para bem informar-vos, encarreguei o 2° Ajudante desta Comissão de levantar
um trecho desse Rio bem como de medir o seu volume de descarga de água, sua
correnteza e examinar a cor e a natureza delas.
Efetivamente foi o Galvez levantado em uma extensão de seis milhas, tendo
nesse ponto apenas 50 metros de largura. Sua correnteza é diminuta, devido a
ser represado pelo Rio Jaquirana. É escura a cor das suas águas, sendo por isso
aqui chamado — um Rio de água preta. A vegetação das suas margens é menos
frondosa que a do Javari, havendo pelo leito do Rio grande número de paus que
já no trecho levantado dificultava a navegação, feita em canoas.
Suas margens são em geral a prumo, havendo poucas e pequenas
praias, apesar de estar o Rio na sua maior vazante, tendo uma altura variável
entre 2,50 m a 3,00 m. Pelas marcas encontradas nas árvores, suas águas apenas
sobem de 0,50 m a 1,00 m sobre os barrancos, no trecho levantado e estudado.
Pela rigorosa medida feita nas Bocas dos Rios Galvez e
Jaquirana, aquele tem 197,443 m3 de volume de descarga de águas por
segundo e este 552,380 m3 o de descarga de águas, também por
segundo, estabelecendo uma relação entre os dois volumes de descarga de 26 para
74 ou, aproximadamente, de um para três.
Este Rio não é habitado, a não ser por tribos de índios
Capanauas, em uma e outra margem, segundo informações colhidas.
É doentio e não possui seringa como em geral toda a margem
esquerda do Rio Javari a não ser em poucos lugares de terrenos alagadiços.
Houve, porém, caucho nas suas terras altas, que acabou-se, retirando-se os
exploradores desta indústria, em geral peruanos, para outros Rios brasileiros.
Nasce este Rio, segundo informações colhidas em Lontananza, Barracão
peruano da margem esquerda do Rio Jaquirana, em terras altas, que ficam ao
Norte deste ponto e que fazem a divisa de águas entre os Rios Jaquirana e
Branco, afluente do Rio Ucaiali, tanto que daí se cruza por terra para aquele
Rio, sem ser ele mais encontrado. Este Barracão fica a 140 milhas da sua Boca,
devendo, portanto, o curso deste Rio ser, por isso muito pequeno.
Além de notar-se a cor escura das águas do Rio Galvez,
fizeram-se observações da temperatura delas em vários pontos do Rio, até onde
foi explorado e estudado, achando-se 26,5° centígrados, enquanto que as
temperaturas das águas dos Rios Jaquirana e Javari são de 29° centígrados.
Assim, dando o resultado dos estudos feitos no Rio Galvez,
cabe-me fazer a comparação com os igualmente executados nos Rios Jaquirana e
Javari e chegar ao resultado de afirmar que o Jaquirana é, incontestavelmente,
a continuação do Rio Javari, pelo seguinte:
O Rio Jaquirana tem:
O volume de descarga de águas
maior do que o Galvez e em uma relação de um para três;
A temperatura das suas águas
igual à do Javari, que é de 29,0° centígrados, enquanto que a do Galvez é de
26,5°, também centigrados;
A cor das águas é branca como a
do Rio Javari, sendo a do Rio Galvez escura e turva;
O seu curso de cerca de 700
milhas até sua nascente enquanto que o Rio Galvez terá talvez pouco mais de 100
milhas, também até as suas nascentes,
É, pois, o Jaquirana a
continuação do Rio Javari, e como tal foi explorado.
Rio ”Jaquirana” ou “Alto-Javari”
O Rio Javari toma o nome de Jaquirana desde a sua confluência
com o Galvez, seu tributário, até as suas nascentes. A sua origem ou nascente é
em uma grota, formada por dois altos contrafortes de uma grande serra, que
suponho ser um dos contrafortes mais Orientais dos Andes dividindo os vales dos
Rios Ucaiali e Madre-Dios.
Corre o Jaquirana ao rumo SW por cerca de 210 milhas. O
espaço, hoje livre de embaraços, que oferece este Rio à navegação em lancha a
vapor, batelões e canoas, excede de 300 milhas. Foi o Jaquirana explorado por
duas Comissões Mistas Brasileira-Peruanas. A primeira em 1864, que não pôde
subir além do ponto determinado aproximativamente por Paz Soldan, Comissário
peruano nessa época, cujas coordenadas são:
— Latitude: 6°50’00” Sul.
— Longitude: 73°56’45” Oeste Gw.
— Altitude: 200 metros.
Tendo, infelizmente, perdido o Brasil um dos seus melhores
astrônomos e hidrógrafos, o distinto Capitão-Tenente Soares Pinto, flechado
pelos índios, e o Peru impossibilitado o seu não menos celebre geográfico Paz
Soldan para levar a efeito tão útil quão proveitosa Comissão, por ter-se também
invalidado com uma flechada na coxa, de modo que, em Manaus, teve de amputar a
perna, escapando assim à sorte que teve seu distinto e infeliz companheiro.
A segunda Comissão Mista Brasileira-Peruana chegou até o ponto
que tem por coordenadas:
— Latitude: 6°59’29,50” Sul.
Longitude:
74°06’26,67” Oeste Gw.
É este Rio bastante notável pelos seus afluentes e pelas
comunicações que eles permitem. Assim, hoje passa-se do Rio Juruá ao Ucaiali,
fazendo-se apenas pequenos trajetos por terra (varadouros).
Caucheiros peruanos há que, quer por comunidade de rápido
trânsito, quer para evitar pagamento de impostos brasileiros, mais elevados que
os do Peru, fazem seguir os seus produtos — Caucho e Sernambi — do Ipixuna, afluente da margem esquerda do Rio Juruá, para
Iquitos pela via terrestre, que pode ser assim delineada:
Do Ipixuna, ou dos seus únicos
afluentes, o São Francisco e o Rio Negro, passam os produtos por terra em
poucas horas até uma quebrada forte ou Igarapé, que entra no Rio Batã ou Paissandu,
afluente da margem direita do Jaquirana, subindo por este Rio até pouco abaixo
do Seis-Solis ou Nueva Estación,
onde tomam boa estrada, que vai, em sei horas de marcha, ao Igarapé Lobo,
tributário do Rio Branco que deságua no Rio Tapichi, um dos mais navegados
afluentes do Rio Ucaiali, e por este Rio, onde há navegação regular a vapor,
são os produtos levados a Iquitos e exportados como peruanos, apesar de serem
de origem puramente brasileira.
Sernambi: caucho de melhor qualidade,
que se coagula sobre o próprio tronco da árvore, nas cavas entalhados no seu
caule. (Hiram Reis)
É desnecessário dizer que, se em tão grande distância são os
produtos levados a Iquitos, os que ficam mais próximos, no Jaquirana, Batã
etc., são também para ali transportados. No Baixo-Jaquirana se faz o mesmo
tráfego, saindo os produtos brasileiros para o Peru por outro Igarapé forte do
Rio Branco, o Iana-Iacú. Há estradas regulares feitas para este trânsito e que
são pelos caucheiros conservadas em bom estado.
Pela mesma via de comunicação recebem-se a mercadorias para
consumo; esta Comissão teve ocasião de comprar, em Seis-Solis, farinha e arroz,
vindos do Pará por estes caminhos.
Toda a população que hoje ocupa os vales dos Rios Jaquirana, Batã
e grande parte do Ipixúna e dos seus afluentes, já em número superior a 5.000
pessoas é de origem peruana, falam, em geral, a língua Quíchua, que é usada
pela gente do povo em todo baixo Andes Oriental, e o mau espanhol, que só falam
os patrões com os agentes das casas fornecedoras de Iquitos.
Todos trabalham com pessoal vindo do Peru, em geral índios já
domesticados da tribo dos Chamacocos, e com aqueles que, em suas correrias,
colhem das malocas das tribos dos Rhemus e Capanauas. Estes índios tornam-se
verdadeiros escravos, trabalham para o patrão a preço miserável da alimentação,
que consiste em simples farinha e algum fumo. São vendidos entre os patrões
como simples mercadoria, aceitando o novo patrão com a mesma indiferença com
que serviram ao primeiro. Este tráfico ilícito é mais comum entre as mulheres
do que entre os homens.
O Rio Jaquirana corre em leito arenoso e suas águas são claras
e transparentes. Em todas as suas praias encontram-se areias grossas e detritos
de rochas de formação ígnea. O terreno de suas margens tem um aspecto mineralógico
muito pronunciado, principalmente nas cabeceiras, nas quais se acham grandes
quantidades daqueles detritos e de conglomerados ferruginosos.
Clima
Embora tivéssemos registrado com regularidade e frequência as
temperaturas diárias máximas e mínimas, bem como o grau higrométrico do ar e a
pressão atmosférica, não podemos, pela insuficiência do tempo e das observações
feitas no mesmo lugar, deduzir a sua temperatura média anual. No entanto,
podemos dela ter um valor muito aproximado, se fizermos aplicação da fórmula do
Sr. Emmanuel Liais:
— T = 56°7’ cos 1 — 28,8°
Emmanuel Liais: autor do “Traite D’Astronomie Apliquee et Geodesie
Pratique”. (Hiram Reis) que nos dá e a temperatura ao nível do mar e em
função da Latitude.
Quer consideremos clima a temperatura média de um lugar, quer
a diferença maior ou menor existente entre as temperaturas médias dos meses
mais quentes e dos mais frios, não podemos deixar de notar uma grande diferença
entre o Rio Javari propriamente dito, isto é, até a Boca do Rio Galvez, e a sua
continuação, o Jaquirana; fenômenos há que se observam no primeiro destes Rios,
os quais não são comuns no outro. Assim é que, em certas épocas do ano,
principalmente nos meses de junho e setembro, estando o ar fortemente aquecido
e com tendência ascensional bastante pronunciada, dá-se um abaixamento brusco
de temperatura, conhecido pelos moradores pelo nome de Friagem, cuja duração é
de três a quatro dias e que tão prejudicial é à saúde pelo desequilíbrio
produzido no organismo desaclimatado, trazendo como consequência as
perturbações dos órgãos respiratórios. Observamos alguns destes fenômenos e
notamos que o termômetro, que marcava na média 26,0° C, diminuía até 17° C. O
barômetro, pela regularidade da marcha que apresenta, marca invariavelmente
suas máximas às 10h e 22h, e suas mínimas ás 16h e 4h.
As friagens anunciam-se por uma baixa rápida do barômetro,
extraordinária elevação de temperatura e saturação quase completa do ar. Sempre
que o Sol desaparece no horizonte, nota-se o fenômeno de condensação dos
vapores contidos na atmosfera e as superfícies expostas diretamente, apesar de
durante o dia não receberem os raios solares, cobrem-se de uma camada aquosa,
tornando difícil e as vezes impossível as observações noturnas para determinação
de posições geográficas, como tivemos ocasião de verificar na Boca do Rio Itecuai
com a ocultação de um dos satélites de Júpiter, cujo instante do fenômeno não
pode ser bem apreciado. E esta condensação torna-se as vezes tão extraordinária
que, quem dorme, como nos acontecia, em canoas e barracas acorda com as camas
bastante úmidas, enquanto que das coberturas da canoas e das barracas caem
grandes gotas de água, como se durante a noite houvesse chovido copiosamente.
É esse conjunto de condições meteorológicas que constitui o
clima desta região, o qual é geralmente considerado insalubre e tem justificado
o seu nome nos números casos fatais de moléstias que têm dizimado aqueles que aí
foram procurar trabalho e fortuna, e que, imprevidentes, sem alimentação suficiente
e habitações apropriadas, sem higiene alguma, praticando excessos de toda a
espécie e sem recursos médicos, adquirem com facilidade, pela natureza dos
trabalhos a que se expõem febres intermitentes e remitentes palustres,
biliosas, algumas com afecções cerebrais, que muito concorrem para semelhante
fama.
Em todo o Rio Jaquirana, porém, já não se encontram desses
fenômenos em consequência de sua Altitude que representa um papel muito notável
na modificação dos climas tropicais, temperando-lhes o calor; tanto assim que,
em regiões situadas próximo do Equador, têm as temperaturas diminuído a tal
ponto que apresentam médias análogas as dos países temperados.
Fazendo-se aplicação da mesma fórmula do Sr. Emmanuel Liais e
adaptando-se 1° de diminuição para cada 180 metros de acréscimo de Altitude
acha-se para temperatura média anual 24,5° C.
Desde que saímos de Manaus, fizemos, de conformidade com as
prescrições do nosso ilustrado médico Dr. Bulcão Vianna, uso dos preparados
arsenicais, e podemos hoje garantir que mais uma vez provaram eles a sua força
profilática, concorrendo conjuntamente com os sais de quinino para debelarem os
inúmeros casos de febre que tivemos alguns de muita gravidade e felizmente
nenhum fatal, como vereis do quadro nosológico apresentado por este
facultativo.
Selvagens do Jaguari
No século passado, segundo escrevem viajantes dessa época eram
as regiões do Vale do Javari habitadas pelas tribos de índios Maronas, Panos,
Tapaxunas e Ticunas. No começo deste século haviam já outras tribos em
substituição àquelas, as quais denominavam-se Colinos, Uaraicos, Jannes e
Mayurunas.
Destas tribos apenas encontrou a, Comissão de 1864, a dos
Mayurunas, já com o nome de Mangeronas, que habitava toda a região ribeirinha
do Javari, sempre feroz e bravia. Foi esta tribo que atacou e perseguiu a Expedição
de 1864, que matou a flechadas o distinto hidrógrafo e astrônomo Capitão-Tenente
Soares Pinto e feriu gravemente o geógrafo peruano Paz Soldan.
Hoje, os índios que vivem no Vale do Javari são em pequeno
número, devido às correrias contínuas, que fazem os caucheiros peruanos para
expeli-los do território onde exploram o Caucho e para tomarem as pequenas,
cuja venda constitui um ramo de negócio lucrativo.
No Baixo-Javari, isto é, da sua Foz até a Boca do Rio Galvez,
existem poucas malocas de selvagens, quase na totalidade já domesticados.
Pertencem eles às grandes tribos dos Marugos e Ticunas, vindos das margens do
Maranhão e principalmente das do Lago, onde foi fundada a cidade de Cavallo
Cocha.
O Vale do Rio Galvez não é hoje habitado Senão por tribos de
índios ferozes que atacam a quantos ali vão estabelecer-se, sendo antigamente
corridos pelos — caucheiros — peruanos que, em tempo, exploraram a indústria da
extração daquela variedade de seringa. São denominados Capanauas, mas pelo seu
estado de selvageria, usos e costumes, creio serem os mesmos Mangeronas ou os
antigos Mayurunas.
O Rio Jaquirana, na sua seção compreendida entre a Boca do
Galvez e a confluência com o Rio Batã ou Paissandu, que denomino Médio-Javari
tem a sua margem esquerda ocupada por malocas de índios Capanauas, aparecendo
na outra margem e na contra-vertente com o Vale do Rio Curuçá aldeias de índios
da tribo denominada Rhemus.
São estes índios fracos e covardes, fogem ao encontro do homem
civilizado e ocupam toda a margem direita do Rio Batã, sendo a esquerda
habitada por tribos de Capanauas, seus ferozes e inconciliáveis inimigos.
Do Batã para cima é o Vale do Rio Jaquirana habitado
exclusivamente por tribos de índios Capanauas, até onde chegamos, isto é, às
suas vertentes.
Quanto aos usos e costume destas duas tribos, que hoje ocupam
o Vale do Rio Jaquirana, pelo que notamos e ouvimos, são os Rhemus os que usam
ornatos no corpo.
Pintam ou tatuam o corpo com resina do — caucho —, fazendo uma
pintura indelével formando figuras extravagantes e mesmo imaginárias,
principalmente as mulheres, quando adolescentes. Os homens pintam-se desde
pequenos. Furam os lábios inferiores, orelhas e nariz, que ornam com penas de
araras e outras aves, usam pendentes ao pescoço e cintura, colares e cintas
feitas de conchas, dentes de animais e de certa madeira dura e perfumada.
Não são antropófagos. Casam-se desde a tenra infância, sendo
isso por simples designação do Tuxaua ou seu Chefe. Como em geral entre todas
as tribos de selvagens que temos visto, lhes é inteiramente desconhecida a
menor noção de pudor. Andam os homens nus, usando as mulheres pequenas tangas
de tucum ou de contas de madeira, pendente da cintura, quando chegam a ser
mães.
Quanto aos Capanauas, são índios mais robustos e fortes, mais
claros que os Rhemus e alguns há inteiramente brancos. Conservam, entretanto,
os traços característicos da raça geral, como cabelos duros e negros, maçãs do
rosto salientes, tendo a forma da cabeça muito original, conseguindo isso por
meios artificiais. Assim, desde a infância comprimem a cabeça com talas de
madeira, dando a ela, pelo uso contínuo deste aparelho, a forma de um chapéu
armado. As mulheres fazem a mesma compressão que os homens, porém em sentido
oposto. Não pintam o corpo e são por isso esbeltas e elegantes.
Fazem uso nos seu ataques da lança e tacape e utilizam-se
raras vez de arco e flecha, a não ser quando pescam e caçam. São ousados e
valentes, atacam o homem civilizado de frente e não por traição, como em geral
fazem a demais tribos.
Casam-se na idade própria, por amor e inclinação, sendo a
cerimônia simplesmente o consentimento do Curáca, seu Chefe e Senhor.
São antropófagos, mesmo entre si, não poupando os próprios
parentes, salvo se a morte foi devida ao veneno de cobra ou a moléstia
epidêmica por eles classificada.
Quanto aos seus inimigos, não os poupam, matam-nos sem
piedade, fazendo as maiores atrocidades.
De uma índia dessa tribo pudemos colher informações;
declarou-nos ser o prato predileto nos seus canibais festins os miolos e as
mãos das vítimas, apreciando em demasia os do homem civilizado.
Dos seus ossos, dentes, etc., fazem troféus de guerra
conservando alguns a cabeça na frente de suas malocas, espetada na própria
lança do guerreiro que matou a vítima.
Foi esta tribo que acompanhou e perseguiu a Comissão desde o
Galvez até as nascentes do Rio Javari, atacando-a no Rayo, último ponto
habitado, quando de volta procurávamos de novo as canoas.
Foi preciso repeli-la a bala e por espaço de muitos minutos
manteve o pessoal da Comissão fogo renhido, até que se retirou.
Flora e Fauna do Rio Javari
Produtos naturais. O
Caucho. Gutta-percha. A Seringa.
Seu Fabrico.
Constituição mineralógica.
O espetáculo da natureza animada, onde o homem não figura tem
alguma coisa de estranho e triste, e a contemplação das grandiosas florestas
virgens do Vale do Javari produz no espírito mais prevenido uma admiração
profunda pela luta real que se observa, por uma rivalidade tal entre as
plantas, de todo o gênero, que mostra o que é a vida vegetal nessas florestas;
é a verdadeira luta pela existência. Um cheiro acre nota-se no interior delas
onde os raios do Sol nunca penetram.
As árvores, ávidas de calor e luz, desenvolvem-se em altura,
em detrimento do diâmetro dos seus troncos, tomando, pela fragilidade destes e
pelo sustentáculo que outras lhes oferecem, posições grotescas e complicadas.
Assim, vê-se ali cipós e outras plantas trepadeiras abraçando
colossais árvores, como a sumaumeira (Eriodendron sumauma) maçarandubas (Lucuma
procera), castanheiras (Bertholletia excelsa), cedros (Cedrela brasiliensis) e
peróbas (Aspidosperma), ao lado de frágeis arbustos que apenas suportam o peso
deles, lutando para romper os apertados laços que os oprimem.
Vê-se também palmeiras
em número e variedades extraordinárias, cobertas dos troncos às ramas de
inúmeras parasitas, de formas de flores pouco conhecidas, e os próprios cipós,
de diâmetro até 0,30 m, por seu turno também abraçados por outros mais frágeis,
que procuram, subindo por eles o calor e a luz direta do Sol, que apenas é
gozada pelas grandes sumaumeiras, castanheiros, etc., cujas copas ultrapassam a
vegetação em geral.
Encontram-se nas florestas do Rio Javari também a copaíba
(Copaifera Jacquinii), o pau mulato, e por toda a margem do Rio o cacoeiro
(Theobroma cacáo), a baunilha (Vanilla aromatica), a salsaparrilha (Smilax
syphilitica) e várias plantas medicinais.
Sua fauna não é menos rica do que a flora; desde as formas
colossais até aos ínfimos seres e às organizações mais imperfeitas, tudo se
encontra nestas florestas seculares. É habitada por macacos, desde a pequena
raça dos Sauís (Chrisothrix entomophaga) e micos (Midas bicolor) até os
barrigudos (gênero Lagothrix), cobertos de uma lã cinzenta, coatás (Ateles
paniscus) de pele preta, coberta de cabelos compridos, e guaribas (bugios).
Encontra-se somente a onça (Felix onça) entre os carnívoros; como roedores
a cotia (Dasyprocta aguti), a paca (Cœlogenis paca), a capivara (Hydrochœrus
capibara), o pereá ou preá e o rato do mato. Somente a lontra (Lutra
brasiliensis) representa a espécie de Martas. A variedade dos porcos do mato
(Dicotyles torquatus) é grande; existe em quantidade a anta (Tapirus
americanus), e não é raro ver-se no Baixo-Javari o veado (Cervus rufus).
Poucas cobras existem no Alto-Javari, a não ser de pequenas
grandezas e espécies muito conhecidas. Há, porém, no Baixo-Javari a terrível
Sucurijú ou Sucurirú (Boa aquática), que habita o Rio, escolhendo os remansos
os mais profundos.
Entre os pássaros, encontra-se uma variedade incalculável,
desde o pequeno periquito verde até a grande arara, de variedade e plumagem de
admirar, e do bacurau (Caprimulgus nocturnos) até o urubú-rei (Cathartes papa).
De Morcegos há também muitas variedades, sobressaindo o
pequeno, que ataca o homem quando em repouso. Foi esta uma das pragas que mais
fez sofrer o pessoal da Expedição, principalmente quando teve de viajar pelas
florestas do Alto-Javari.
Como caça, são frequentes as Pombas, os Mutuns, Jacamins,
Cujubins e Inhambus, e, na margem do Rio, Marrecas (Anas brasiliensis), patos
mergulhões (Plotus anhinga) de espécies variadas, Marrecões e Garças brancas e
pardas, cujas penas são muito bem reputadas no comércio do Amazonas.
Quanto aos habitantes do Rio, propriamente, encontra-se no
Baixo-Javari duas variedades de Botos (Delphinus amazonicus). Só no Baixo e no
Médio-Javari pescam-se Piranhas (Serralsamo Piranha), Surubis (Platistoma
Lima), Pirararas e, nas Bocas dos Lagos, a Traíra (Synodus).
No Baixo-Javari encontra-se o Jacaré de várias grandezas,
desde o Jacaré-tinga (Caiman sclerops) até o Jacaré-açu (Caiman-niger). Este
chega a grandes dimensões. A Tartaruga (Emys amazônica) e o Tracajá (Emys
tracaja) aparecem até muito acima no Alto-Javari. O Jabuti (Testudo tabulata)
só é visto nas matas e principalmente nas serras altas.
É admirável a variedade de espécies de borboletas e outros
insetos; e não menos admirável é até — a praga.
Esta se compõe de Piuns, Carapanãs, Abelhas, principalmente a
amarela, que ocupam a atenção de quem ali vai e impossibilitam todo e qualquer
trabalho. A mutuca e várias espécies de moscas, principalmente a denominada
pelos caucheiros Cabo-verde —, produzem dores e inflamação na parte atacada,
bem como a formiga Tocandeira — (Cryptocerus causticus), cuja mordedura faz
sofrer dores, como de queimaduras, por muitas horas.
Entre a variedade enorme de produtos naturais, já enumerados,
sobressai, no Baixo-Javari, a Seringa (Siphonia elastica), e, no Médio e Alto, o
— Caucho — (Hevea guyanensis) e a Gutta-percha (Isonandra percha).
O fabrico de borracha de seringueira é hoje muito conhecido;
deixo por isso de descrevê-lo.
O caucho e gutta·percha, seus similares, que constituem
principalmente a forte indústria daquela zona, são preparados de outra forma. Derribada
a árvore que produz o leite com que preparam o — Caucho —, é o tronco, com
ramos e raízes, expurgado de todo o leite, que é depositado em uma cova ao lado
da própria árvore. Para fabricar o “caucho”
fazem coagular este leite com água de sabão sem dúvida por causa da potassa
nela contida, ou, na sua falta, com o sumo de um cipó, que vive mesmo ao lado
da árvore do “caucho”. Coagulado o
leite, toma o sólido a forma da cova, que, em geral, é de um paralelepípedo, e
que denominam os caucheiros — pranchas
(planchas).
A “gutta-percha”,
ainda pouco explorada, sofre o mesmo preparo que o “caucho”, porém coagula simplesmente ao ar livre, não precisando
senão agitar o leite de tempo em tempo. Dura o processo 24 horas. Há duas espécies
de “gutta-percha”, a de leite branco,
mais comum, e a de leite amarelo. Ambos os produtos da “gutta-percha” são mais pesados que a água, sendo o caucho e
borracha mais leves. Estes dois últimos obtêm nos mercados dos Estados Unidos
da América do Norte e na Europa maior preço que o primeiro.
Sendo grande a variedade de madeiras próprias para construção
civil e naval, é para lamentar não existir nem início de tão útil quão
lucrativa indústria, usando os caucheiros, para a construção de suas barracas,
apenas palmeiras, entrando no primeiro plano a útil “Paxiuba” (Iriartea exorrhiza Mart.), que é aplicada desde os
esteios e vigamentos até os soalhos e divisões internas.
Caracterizam a constituição mineralógica do Vale do Rio Javari
depósitos de xistos silúricos rolados, cobertos de grés (espécie de argila misturada com areia fina e empregada em
olaria) de diversas cores, sobretudo o vermelho, xistos argilosos e enfim
camadas de antracite, em veios que correm, em geral, na direção Leste-Oeste.
Nenhum fóssil foi
achado, porquanto, sendo a nossa exploração especialmente destinada ao próprio
Rio, não foi possível procurar petrefatos que devem conter as camadas de
aluvião, e por essa razão nada se pode afirmar sobre a idade geológica do Vale
do Rio Javari. Entretanto, pela natureza da sua constituição, por nós
verificada nos cortes das suas margens, e pelos fósseis achados por Chandlers
no Juruá, Vale vizinho ao do Javari, parece pertencer ao sistema — devonio siluriano.
Cronometria
O conhecimento da posição de um ponto qualquer da terra se
reduz à determinação de sua Latitude, Longitude, Azimute ou Direção do
Meridiano e sua Altitude. Os três primeiros elementos são entre si ligados pela
relação fundamental:
Sen. a = sen. l sen. D + cos. l cos. D.
cos. H,
na qual “D” representa a Declinação do
astro, dado pelo almanaque náutico ou conhecimento do tempo, e “a”
sua Altura. Vê-se, pois, que as incógnitas são: “l” ou Latitude do
lugar, “H” ou Hora do mesmo lugar, a qual, comparada com a do
primeiro Meridiano, dada, pelo cronômetro, determina a Longitude.
O aparecimento dos cronômetros, também chamados relógios
marítimos, marcou, sem dúvida alguma, uma época notável na história da
navegação, enriquecendo-a de novos elementos de perfeição na determinação das
posições geográficas. Foram eles construídos na França pela primeira vez, em
1766, pelo ilustre sábio Ferdinand Berthoud, e, coincidência notável, ao mesmo
tempo na Inglaterra por Harrison. É por meio destes instrumentos que se conhece
a hora precisa do primeiro Meridiano, a qual em qualquer instante, comparada
com a que se obtém pelas observações dos astros, nos dá a Longitude. A questão,
por conseguinte, se reduz a saber qual o seu atrasamento ou adiantamento sobre
o tempo médio do primeiro Meridiano, isto é, seu estado absoluto.
Se o cronômetro tivesse uma marcha uniforme, uma vez
determinado o valor de seu estado absoluto em um certo dia, bem como a variação
que se obtém pela comparação de dois estados absolutos, em dado intervalo de
tempo, e que se denomina — marcha diurna —, o grande problema da cronometria se
resolveria com extrema facilidade. A regularidade, porém, destas marchas está
sujeita a diversas perturbações, as quais dividiremos em duas classes: aquelas
devidas ao próprio mecanismo do instrumento e à sua construção, e àquelas que
produzem as circunstâncias exteriores.
As primeiras são: aceleração, saltos e defeito de compensação;
as outras: resistência do ar, magnetismo e eletricidade, umidade atmosférica
oxidação da espiral, efeitos dos movimentos de transporte e choques. Foram a
umidade atmosférica e efeitos dos movimentos de transporte as causas que mais
diretamente influenciaram os cinco cronômetros, que pela regularidade de suas
marchas, tínhamos levado para esta exploração; os quais eram: de John Poole n°
8.367, 8.368 e 4.496; de James Poole n° 5.692 e de Parkinson & Frœdsham n°
3.265 ; o primeiro dos quais servindo de padrão.
Os três restante dos autores John Poole n° 4.759 e 3.660 e
Robert Roskell n° 659/4.518, não possuíam marchas regulares, tendo sofrido
variações acidentais, as quais somente podemos atribuir, à influência do óleo
empregado na lubrificação de suas peças ou ao escapamento ou a defeitos das
pedras formando os “contrapivots”,
porque, sendo desiguais estas superfícies, deve resultar deslocamento dos eixos
e consequentemente variações em suas marchas, pelo que ficaram entregues aos
cuidados do Sr. Capitão de Fragata, Capitão do Porto e Comandante da Flotilha
deste Estado.
Quem já experimentou viagens feitas em canoas, sem comodidade
de espécie alguma, suportando choques provenientes dos muitos obstáculos
encontrados em um Rio, em sua maior vazante reconhece com facilidade o que
dizemos. Além disto, a viagem por terra, subindo e descendo montanhas, algumas
de mais de mil metros de altura, sem o necessário para o seu transporte, pela
natureza do terreno, imagina o quanto devem sofrer estes instrumentos.
Se a marcha de um cronômetro não tivesse irregularidades, ou
então se possuíssemos o meio de determinar com exatidão o valor numérico das
perturbações, o cálculo da hora do primeiro Meridiano seria rigoroso, e
dispondo como nos acontecia de cinco destes instrumentos, eles nos dariam
resultados idênticos.
Sendo a marcha de um cronômetro uma função definida do tempo e
da temperatura, as perturbações podem ser reconhecidas, porém sua avaliação
numérica rigorosa é impossível não se lhe podendo dar senão um valor
aproximado.
É, portanto, teoricamente indeterminado o problema, qualquer
que seja o numero dos cronômetros; na prática, porém, com instrumentos bem
regulados, esta indeterminação pode ficar circunscrita dentro de certos
limites.
Desde a invenção dos cronômetros, se estuda a influência das
temperaturas sobre as suas marchas e, na descrição da viagem feita a bordo do “Isis” para se experimentar estes
instrumentos, Fleurieu prova que, independentemente do efeito da temperatura,
os cronômetros experimentam uma aceleração e concluiu de suas observações que,
apesar de tomar em consideração a equação das temperaturas, o movimento diurno
variava proporcionalmente ao tempo.
Borda, De Rossel, o Almirante Fitz Roy, Mouchez e outros,
também conheciam esta influência. M. de Cormelier, depois de ter chegado à
convicção de que a temperatura é o fator de perturbação o mais importante, foi
o primeiro a exprimir a marcha por uma expressão algébrica do tempo e da
temperatura.
Deve-se, porém, a Lieussou a glória de ter estabelecido, por
observações numéricas, que a marcha de um cronômetro é uma função bem definida
do tempo e da temperatura e para representar a marcha correspondente a uma
temperatura “” e a uma época “t”, apresentou a fórmula:
a qual pode ser assim traduzida: Em uma mesma temperatura a
marcha de um cronômetro cresce proporcionalmente ao tempo; “a” é o coeficiente da aceleração.
Quando a temperatura varia, esta marcha também varia, porém não
proporcionalmente ao tempo; se é a mesma para duas temperaturas e ‘ ela sofre passando de uma a
outra, a princípio uma aceleração, depois um atraso e atinge seu máximo para a
temperatura média entre as duas, a qual se denomina — “temperatura de compensação” dada pela fórmula .
Os melhores métodos para a determinação dos estados absolutos
são: observação das passagens meridianas do Sol e estrelas; observações de
distâncias zenitais e observações das alturas duplas tomadas com o círculo de
reflexão ou sextante com horizonte artificial.
Das observações com o sextante de Casella de dois planos
fazendo sempre uso da luneta inversa e invertendo a posição do horizonte de
180°, conseguimos determinar o estado absoluto por meio de série de alturas do
Sol, nas quais os erros de observação se atenuavam o mais que era possível já
que não se achava montada a luneta Meridiana de Brünner.
Junto encontrareis o mapa dos diversos estados absolutos
achados.
Para a determinação da marcha diurna fizemos uso do método
Legendre.
A Latitude, Longitude, Azimute ou direção do Meridiano, e
Altitude, elementos indispensáveis para o conhecimento da posição de um ponto
qualquer da terra, foram determinados com a precisão possível em Comissões
desta natureza, e dos resultados achados nos diferentes processos empregados
tomávamos uma média, que era considerada definitiva.
Vos envio também um mapa demonstrativo das coordenadas astronômicas
dos diversos pontos; navegando-se em círculo fechado, e por ele vereis como
foram insignificantes as diferenças encontradas, o que dá uma ideia segura do
estado dos cronômetros, e podereis assim apreciar o grau de exatidão dos
trabalhos executados.
///\\\
Fonte: GOMES,
Augusto da Cunha. Comissão de Limites
Entre o Brazil e a Bolivia – Re–Exploração do Rio Javari – Brasil – Rio de
Janeiro – Typographia Leuzinger, 1899.
Livro do Autor
O livro “Desafiando
o Rio-Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na
Livraria EDIPUCRS – PUCRS, na rede da Livraria Cultura (http://www.livrariacultura.com.br)
e na Associação dos Amigos do Casarão da Várzea (AACV) – Colégio Militar de
Porto Alegre.
Para
visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
Coronel de
Engenharia Hiram Reis e Silva
Professor do
Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
Presidente da
Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
Membro da
Academia de História Militar Terrestre do Brasil - RS (AHIMTB - RS);
Membro do
Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS);
Colaborador
Emérito da Liga de Defesa Nacional.
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