A catarinense Mayra Ceron Pereira, que mora na cidade de Lages, se sentiu incomodada com a lição de casa do filho, no início do ano. Aluno da 7a série do colégio Bom Jesus, uma rede privada do sul do país, Gabriel, de 13 anos, tinha de definir o que é a mais-valia. Ela folheou o livro Terra e Propriedade, da coleção História Temática, que ele usa na escola, e encontrou uma foto de José Rainha, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). “Ele aparecia apenas como líder social”, diz Mayra. “Não havia a informação de que foi condenado pela Justiça.” Em uma leitura mais atenta, ela se incomodou ainda mais com o que identificou como maniqueísmo nos textos.
Quem escolhe os livros didáticos;
Como o material é avaliado nas redes pública e privada;
Quanto eles vendem.
O autor escreve o livro didático. A cada três anos, as editoras encaminham suas coleções para avaliação do Ministério da Educação. No ano passado, 13 editoras inscreveram 587 coleções. O segmento de livros didáticos movimentou R$ 1,2 bilhão entre 2007 e 2008. Cerca de 58% do faturamento vem da venda para o governo federal.
1 - O MEC envia esses livros para universidades públicas. Cada disciplina vai para uma universidade, que monta uma banca de professores da área para avaliar o conteúdo;
2 - As universidades têm seis meses para elaborar um parecer justificando quais livros serão aprovados e excluídos. Além de um documento com recomendações e ressalvas para auxiliar o professor na escolha dos livros aprovados;
3 - Entre março e abril, o MEC divulga a lista dos aprovados. E envia a justificativa de exclusão dos não aprovados para as editoras;
4 - A lista fica na internet e as escolas públicas escolhem, com os professores, os livros que vão usar;
5 - O MEC compra os livros e, no início do ano seguinte, eles estão nas mãos dos alunos.
NAS ESCOLAS PARTICULARES:
1 - Vendedores das editoras mostram os livros nas escolas particulares;
2 - A maioria das escolas usa como referência a lista de aprovados pelo MEC, por opção própria.
APOSTILAS.
Algumas escolas do país usam sistemas de apostilas feitas por grandes empresas de educação como Objetivo, Anglo, Pitágoras, UNO e Positivo. O material feito por essas editoras nem passa pelo MEC. (Fontes: Ministério da Educação, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e Associação Brasileira de Editores de Livros).
As bancas das universidades que analisam os livros para o MEC costumam rejeitar títulos por má qualidade do conteúdo. São freqüentes os casos de livros recusados por informações incorretas, uso de linguagem inapropriada ou mesmo expressões racistas ou preconceituosas. Um dos critérios para a exclusão de livros é a doutrinação política. Mas a banca deixa passar títulos que condenam o capitalismo e enaltecem o socialismo.
Em uma coleção excluída depois de ser distribuída por três anos pelo MEC, os índios são retratados como seres incivilizados, e os nordestinos como culpados pela pobreza nas grandes cidades.“Livros que induzem a preconceitos e estereótipos levam a uma formação errada, uma visão distorcida do mundo. Formam pessoas racistas, com xenofobia. As idéias de que no Nordeste só há seca e miséria e que todos os alemães são nazistas não ajudam o aluno a compreender o mundo”, afirma a historiadora Margarida Matos, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Ela coordenou a banca que excluiu o livro "Nova História Crítica" da lista do MEC neste ano. A visão doutrinária foi apenas um dos problemas identificados.
“Para entender o mundo, os professores passam a adotar uma lógica conveniente, simplista e sedutora” Samuel Pessoa, da Fundação Getúlio Vargas.
A visão maniqueísta da História pode ser encontrada já no curso de Pedagogia. Para mostrar isso, Bráulio Porto de Matos, da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, compara os manuais de didática mais usados pelos professores na década de 60 com o livro mais popular de hoje. O manual de Amaral Fontoura, usado até os anos 70, era principalmente técnico: fazia críticas ao processo de ensino. A obra mais atual, de Carlos Libâneo, no entanto, já em suas primeiras páginas fala sobre a perversidade do capitalismo. (Por Alexandre Mansur, Luciana Vicária e Renata Leal na revista ÉPOCA) Artigo completo aqui.
Imagens:uncovering.org_livros.
O discurso dos livros.
A reforma agrária é apresentada como solução para a concentração de terras no Brasil. Não se fala que o setor terciário urbano é que tende a absorver essa mão de obra. A revolução armada é apresentada como solução justificável para acabar com a opressão. Os autores omitem que esses golpes costumam levar a ditaduras. Alguns livros didáticos do Estado do Paraná reduzem o mundo a um conflito entre as elites dominantes e os povos dominados. Os Estados Unidos são apresentados como um império de influências negativas. Não se fala da história de independência, democracia e direitos humanos do país. Continua...
“Eles ensinam para crianças e jovens fatos que não são verdadeiros, distorcendo a finalidade da educação”, Bolívar Lamounier,cientista político.
Atenção: Aqui a lista de doze títulos didáticos que apresentam distorções ideológicas (ver imagens):
2) (História 8, Projeto Araribá, Editora Moderna);
3) (Nova História Crítica. Mario Furley Schmidt. São Paulo: Nova Geração, 2002);
4) (apostila do programa Livro Público do Governo do Paraná, capítulo “Dinheiro Traz Felicidade”, Gisele Zambone);
5) (História Global – Brasil e Geral/Volume Único. Gilberto Cotrim. São Paulo: Saraiva, 2002);
6) (História do Brasil no Contexto da História Ocidental/Ensino Médio. Luiz Koshiba e Denise Pereira. São Paulo: Atual, 2003);
7) (exercício proposto por História Temática: Terra e Propriedade, 7a série. Andrea Montellato, Conceição Cabrini, Roberto Catelli Junior. São Paulo: Scipione, 2005 – Coleção História Temática);
8) (apostila com módulo de História do Sistema UNO de Ensino, de Nicolina Luiza de Petta);
9) (apostila História 3 – coleção Anglo. Cláudio Vicentino e José Carlos Pires de Moura);
10) (Brasil: uma História em Construção/Volume 2. José Rivair de Macedo e Mariley Oliveira
Editora do Brasil);
11) (apostila do programa Livro Público do Governo do Paraná, Ideologia, Katya Picanço);
12) (apostila do programa Livro Público do Governo do Paraná, O Estado Imperialista e Sua Crise, Altair Bonini e Marli Francisco).
Fotos: Alex and Laila/Getty Images, Greg Baker/AP e Renata Carvalho/Ag. A Tarde/AE, Marcelo Rudini/ÉPOCA, Guto Kuerten/ÉPOCA.
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