quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

MISSÃO DADA É MISSÃO CUMPRIDA!

Hiram Reis e Silva, Rio Branco, Acre, 06 de dezembro de 2012
 É muito melhor arriscar coisas grandiosas, alcançar triunfos e glórias, mesmo expondo-se à derrota, do que formar fila com os pobres de espírito, que nem gozam muito, nem sofrem muito, porque vivem nessa penumbra cinzenta que não conhece vitória nem derrota. (Theodore Roosevelt)
-  Descida do Juruá
Quando aceitamos o grande Desafio de descer o mais sinuoso Rio do Planeta – o Rio Juruá – desde a Foz do Breu na fronteira peruana até Manaus reconhecendo também uma extensão de 50 a 400 km dos principais afluentes de sua Bacia, colocamos como impositivos dois pontos:
-   Passarmos à disposição do Comando Militar da Amazônia (CMA) pelo período de 13 meses;
-   Conseguirmos recursos institucionais para viabilizar uma complexa expedição a remo numa extensão de aproximadamente 5.000 km nestes ermos sem fim.
O CMA imediatamente viabilizou nossa primeira pretensão, a segunda, porém, esbarrou em um bastião quase intransponível – a Burocracia da máquina pública tão assolada por desvios e irregularidades. Apesar da extrema boa vontade dos titulares de todas as organizações consultadas não se conseguiu vencer os óbices legais. Contando com estes recursos adquirimos equipamentos eletrônicos necessários para realizar um reconhecimento de engenharia da Bacia Juruá, visando:
a)          corrigir distorções dos Mapas do IBGE e Multimodais do DNIT no que se refere à localização e/ou denominação de Comunidades Ribeirinhas e da fisiografia (Ilhas, Rios, igarapés, Lagos...);
b)          verificar as condições dos Portos Hidroviários e se os mesmos atendem à demanda atual;
c)          verificar a necessidade de implementação de alterações nos projetos dos Portos Hidroviários existentes;
d)          verificar a necessidade da construção de novos Portos Hidroviários;
e)          identificar possíveis obstáculos à navegação e apontar as medidas necessárias à sua remoção; 
f)           Apresentar ao final da expedição um relatório detalhado das observações realizadas e apontar as medidas a serem adotadas.
As despesas decorrentes dos equipamentos adquiridos e do deslocamento de uma equipe, mesmo sob regime espartano, durante cinco ou seis meses percorrendo tortuosos meandros de um curso d’água em uma região bastante agreste e desabitada são consideráveis.
-  Sina de um Bandeirante
Ser bandeirante é deixar atrás a casa e família, o bem estar e a segurança, para perseguir o sonho e tentar a casa da glória, é viver silencioso e otimista na brenha onde não há rumos, no campo onde não há divisas, estremecer às vezes de febre, mas nunca tremer de medo, é sofrer com alegria o sol dos chapadões e resistir sem queixa nos aguaceiros de dezembro, é combater no varejo as cachoeiras e investir, de simples facão à cinta, contra a floresta. (Gofredo T. da Silva Teles)
Infelizmente, os recursos esperados ainda se encontram na fase da promessa, o caiaque e a “voadeira” de apoio ainda não chegaram a Cruzeiro do Sul, AC, estão armazenados no 5º BEC, em Porto Velho, RO. Decidimos, ainda assim, encarar o desafio de qualquer maneira mesmo levando em conta as dificuldades adicionais proporcionadas pela falta de aporte financeiro. Vamos tentar buscar suporte junto às autoridades de Cruzeiro do Sul, quem sabe? Se não conseguir pagarei o transporte das embarcações para Cruzeiro do Sul de meu próprio bolso como fiz com as passagens da equipe de apoio, o que mais se pode fazer?
As dificuldades da prestação de contas de Expedição exploratórias por lugares remotos deveriam encontrar o devido amparo em Lei. Como posso exigir de um ribeirinho a Nota Fiscal de um cacho de banana ou de um bocado de farinha produzida no seu roçado? Como proceder ao adquirir o combustível na barranca do Rio ou pagar o conserto do equipamento danificado? 
A impossibilidade de prestar contas de despesas sem documentos que as comprovem foi, desde o início, o grande embaraço que impediu que recebemos os recursos prometidos. Felizmente conseguimos, mais uma vez o apoio de velhos e novos investidores que minimizaram, um pouco, nossa angústia.
É interessante observar que as pessoas se surpreendem com nossas infindas jornadas pelos imensos caudais amazônicos sem se dar conta de que a fase mais difícil, mais complexa e que exige mais esforço é a que antecede a expedição. Afastar-me por cinco ou seis meses de casa deixando uma esposa acamada que necessita cuidados especiais 24 horas por dia, falta de recursos financeiros, dificuldade para o transporte das embarcações e tantos outros itens que não cabe aqui enumerar representam, sem dúvida a fase mais estressante da jornada.
A era das Expedições e das Bandeiras parece ter findado. Minha aflita alma de desbravador sente uma dor infinda. Poderíamos hoje reverenciar a memória de tantos naturalistas e pesquisadores de outrora se estes encontrassem idênticas dificuldades pecuniárias? Teriam os Chefes das Comissões de Limites de outrora, Barão de Tefé, Thaumaturgo de Azevedo, Cunha Gomes e tantos outros conseguido cumprir sua missão se precisassem realizar licitações para comprar ou consertar seus equipamentos e embarcações ou adquirir gêneros para sua tropa? Teria nosso grande Marechal da Paz – Candido Mariano da Silva Rondon – conseguido implantar milhares de quilômetros de linhas telegráficas se estivesse sujeito à lei das licitações? Como aperfeiçoar a cartografia atual sem perambular pelos ermos sem fim onde não se usa a tal da Nota Fiscal? 
Alguns desavisados sustentam que a tecnologia substituirá definitivamente o trabalho de campo. Ledo engano, a nomenclatura e a localização exata dos acidentes naturais e das povoações precisam ser confirmadas “in loco”. Encontrei, nas minhas longas jornadas fluviais, comunidades a mais de doze quilômetros do local marcado nos mapas do IBGE e DNIT. Aos céticos eu convido a verificar pessoalmente a cidade de Tamaniquá, margem direita do Solimões, sete quilômetros a jusante da Foz do Rio Juruá que nos mapas está representada a montante da dita boca ou ainda a denominação do Rio Jaquirana como Javari. Vide: http://www.correaneto.com.br/site/espaco/32207
Por isso nossos mapas institucionais apresentam tantas falhas. Como aperfeiçoá-los se não se consegue equacionar estes intermináveis problemas burocráticos. Uma equipe pequena com equipamentos relativamente simples pode corrigir esses erros, percorrendo trilhas e rios e entrevistando a população local, mas parece que ao governo só interessam projetos de alto custo desde que possam justificar seus gastos dentro das normas legais.
-  Expedição Roncador Xingu
Como era diferente no século passado. Nossos novos bandeirantes eram prestigiados e recebiam o apoio de um governo cujos olhos miravam o porvir e eram aplaudidos por uma sociedade esclarecida e engajada.
Vejamos o caso da Expedição Roncador Xingu cuja partida revestiu-se de toda pompa e circunstância:
Benção da Bandeira Nacional (07.08.1943)
Fonte: O Estado de São Paulo
Numa evocação do São Paulo muito antigo, do São Paulo dos séculos XVII e XVIII, dos bandeirantes que daqui partiam para o alargamento das nossas fronteiras, realizou-se na manhã de ontem, na Basílica de São Bento, uma significativa cerimônia junto ao túmulo de Fernão Dias Pais Leme. (...) Manhã de inverno bandeirante, como que propositadamente encomendada para a evocação da época de Fernão Dias, de Borba Gato, de Anhanguera: e de outros tantos destemidos filhos de São Paulo. A Basílica de São Bento, repleta. Pessoas das mais representativas estiveram presentes a cerimônia da benção do Pavilhão Nacional que seria entregue ao Tenente-Coronel Mattos Vanique, chefe da Expedição Roncador-Xingu. (...) Após a missa solene, celebrada no altar-mor da Basílica, foi iniciada a cerimônia junto ao túmulo de Fernão Dias Pais Leme, onde se encontrava o Pavilhão brasileiro que damas da sociedade paulistana ofereciam ao Tenente-coronel Vanique, para levar à expedição que, a exemplo das antigas bandeiras paulistas, seguirá para a região do Roncador-Xingu. O Pavilhão foi benzido por Domingos de Silos, o que fez uso da palavra o Sr. Gofredo T. da Silva Teles. (...) Depois da locução a senhora Raquel Simonsen passou o pavilhão nacional às mãos do Tenente-Coronel Mattos Vanique. Manifestou-se, então, o Ministro João Alberto afirmando que aquela bandeira haveria de ser honrada, uma vez que seria guardada por mãos de homens fortes bravos, que partiam para o sertão com o intuito de elevar cada vez mais alto o nome de nossa pátria. O Tenente-Coronel Mattos Vanique encerrou a cerimônia agradecendo a bandeira ofertada pelas damas paulistas.
-  Prossiga na Missão! (Gen Ex Silva e Luna)
Há mais pessoas que desistem, do que pessoas que fracassam! (Henry Ford)
O desânimo começava a querer tomar conta de todo o meu ser quando do longínquo pretérito uma voz tonitruante vociferou – Prossiga na Missão! Aqueles que me conhecem sabem que desistir nunca fez parte do meu cotidiano. Se for necessário descerei sozinho os quase 5.000 km que separam a Comunidade da Foz do Breu, AC, na fronteira com o Peru, de Manaus, AM.
Livro do Autor
O livro “Desafiando o Rio-Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na Livraria EDIPUCRS – PUCRS e na rede da Livraria Cultura (http://www.livrariacultura.com.br). Para visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva
Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA); Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS); Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS); Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS); Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional.
Blog: http://www.desafiandooriomar.blogspot.com


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