sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

A MENTIRA INSTITUCIONALIZADA

Por Anatoli Oliynik

A mentira sempre acompanhou o ser humano, desde os seus primórdios. Entretanto, num determinado período da história humana ela institucionaliza-se e passa a ser utilizada como recurso de manipulação, controle e poder.

O ato de mentir, ou a mentira propriamente dita pode ser classificada em quatro tipos distintos, quais sejam:

1. A Mentira Social: é a mentira moralmente aceitável. É a mentira piedosa ou aquela sem conseqüência de qualquer natureza. Exemplo: O sujeito que mente para se livrar de um vendedor ou da moça do telemarketing.

2. A Mentira com objetivo concreto: é aquela em que o sujeito mente para alcançar um determinado objetivo que pode ser legítimo ou ilegítimo:

a) Legítimo: quando o sujeito mente para o ladrão onde está escondido o dinheiro ou quando o soldado mente para o inimigo onde está escondida a munição.

b) Ilegítimo: é aquela em que o sujeito mente premeditadamente para alcançar um objetivo escuso. Esse tipo de mentira é perigoso.

3. A Mentira Patológica ou mitomania: é aquela em que o sujeito mente sistematicamente; ele é incapaz de não mentir. Todavia, ele não mente para si mesmo. Exemplo: Karl Marx e suas teses consubstanciadas em dados estatísticos falsificados premeditadamente por ele mesmo.

4. A Mentira Existencial: é a mais grave de todas. É aquela em que o sujeito mente, inclusive, para si mesmo. Exemplo: Dr. Jekyll e Mr. Hyde do romance “O Médico e o Monstro” (1886) de Robert Louis Stevenson (1850-1894). Luigi Pirandello (1867-1936) é o escritor que melhor expressa esse tipo de mentira. Exemplo: “O Falecido Mattia Pascal” (1904) e “Seis Personagens à Procura de um Autor” (1921). “O Pato Selvagem” (1884) de Henrik Ibsen, também expressa este tipo de mentira.

Estes quatro tipos distintos de mentira acompanham o homem, em maior ou menor grau, em toda a sua existência. Entretanto, gostaria de falar sobre a modalidade da mentira institucionalizada, aquela voltada para manobrar as grandes massas humanas, dominá-las, controlá-las e também corrompê-las.

Essa modalidade tem a sua gênese e toma a sua forma potencializada a partir da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Vejamos alguns relatos:

“A guerra atacou os padrões morais tão rudemente quanto as formas estéticas. O fato de que a matança em massa por qualquer método imaginável se tivesse convertido em rotina, em dever, em propósito moral, foi apenas o mais cruel dos ataques a uma ordem moral que se dizia enraizada numa ética cristã.” (EKSTEINS, 286)

Mais adiante:

“A guerra impôs aos soldados uma ‘viagem interior’, mas os civis empreenderam uma viagem paralela no país natal. A censura e a propaganda desempenharam papel principal neste processo, dissimulando, como era seu propósito, a realidade da guerra. O front interno nunca soube com precisão como a guerra se desenrolava. As derrotas eram apresentadas como vitórias, o impasse como manobra tática. A verdade tornava-se mentira, e a mentira verdade. Como o eufemismo se tornou a ordem do dia oficial, a linguagem foi virada de cabeça para baixo e de dentro para fora. Inventaram-se histórias de atrocidades, e calava-se sobre atrocidades reais.” (EKSTEINS, 298) (grifos meus).

“As fronteiras entre a verdade e a mentira tornaram-se tão indefiníveis que se tomavam os desmentidos oficiais de boatos por tentativas de desorientar o inimigo.” (EKSTEINS, 300)

Nesse paradoxo, enquanto as esferas social e cultural pareciam se afastar uma da outra, a essência da experiência moderna permaneceria.

“O mundo tornou-se uma invenção da imaginação, ao invés de ser a imaginação uma invenção do mundo.” (EKSTEINS, 302)

Nesse lodaçal a imprensa liderava o esforço de propaganda, mas clérigos, educadores, músicos e autores o reforçavam. Todos os beligerantes se envolveram na criação de mitos e na distorção da realidade. A realidade, o senso de proporção e a razão – eis as principais baixas da guerra. (grifos meus)

E assim os novos governantes, a nova imprensa e as mentes psicóticas satanizadas encontram o caminho pavimentado para exercer a manipulação, o controle e o poder sobre as massas, transformando o Estado em pai, protetor e a mãe gentil de todos. Que receita! Que descoberta! Nada tão apropriado para justificar o gigantismo do Estado!

O grande Leviatã se ergue de suas trevas e lança suas garras sobre nós transformando-nos em amebas, incapazes de enxergar o mundo e a realidade e até de governar nossas vidas. Totalmente dependentes do grande pai, na verdade o Grande Irmão, que tudo vê, tudo sabe e tudo controla, encarceramo-nos numa prisão sem grades na busca da proteção patrimonialista utópica.

O resultado de tudo isso é este mundo irreal, fantasioso, utópico, imbecilizado pela cultura do coitadismo, do direito sem obrigações, na qual a massa se encontra.

Até quando a grande massa chafurdará nessa mentira levada a efeito pelo Estado moderno que se potencializou a partir da Primeira Guerra Mundial?

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