quinta-feira, 3 de novembro de 2011

ADVOGADOS, PELA PRIMEIRA VEZ

“No concerto o homem conserta com acerto” (Gudé)

Por José Eugênio Maciel

“Todos somos iguais perante a lei, mas não perante

os encarregados de fazê-la cumprir

Anônimo

Pertences fazem parte da história, simbolizam acontecimentos. Ao se desfazer deles, o que fica é a memória dos fatos. Há poucas semanas vendi o veículo ômega, e, ao entregá-lo, veio à lembrança um episódio marcante. Antes de ser meu, o carro pertencia ao Ricardo Borges Botaro, conhecido apresentador de rádio e tevê na nossa cidade.

Quando o carro ainda pertencia ao Ricardo, nós fomos à Curitiba prestarmos juramento devido à aprovação no temido Exame de Ordem. Na solenidade recebemos o número da nossa inscrição na OAB – Ordem dos Advogados do Brasil. Vale ressaltar, para aqueles que não saibam, ao se formar em Direito a pessoa de imediato tem somente o diploma do curso superior, bacharel. São indispensáveis a aprovação na mencionada prova e o juramento para exercer a profissão de advogado.

Lá na capital, pouco antes do evento, a emoção tomava conta através das reminiscências, a nossa trajetória para concluir os estudos, anos de estrada, noites e madrugadas longas longe da família e muita convivência traduzida em amizades. Comento com o Ricardo, ”daqui a pouco seremos realmente advogados”, enfatizei indagando: “Como e quando será a primeira vez em que diremos para alguém que perguntará o que somos? E diremos: ‘eu sou advogado’”.

Terminada a solenidade, iniciamos a volta para Campo Mourão. A viagem é tranquila, vínhamos animadamente proseando diversos assuntos até que o Ricardo – que dirigia o ômega dele e que eu jamais imaginaria comprar – fica sério e preocupado. Embora não desenvolvesse alta velocidade, ele diminui bastante, quando eu lhe pergunto o motivo da grande preocupação, Ricardo me responde:

- Acho que tem uma viatura policial seguindo a gente! Por vários quilômetros eles acompanham nosso carro, já poderiam ter ultrapassado, chegam bem perto, mas continuam atrás!

Cerca de 20 quilômetros antes de Guarapuava os policiais sinalizam para que parássemos, o Ricardo estaciona o carro enquanto imediatamente à nossa frente a viatura encosta com sirene e giroflex ligados:

- Mãos para o alto, na cabeça, os dois!

Quatro homens com armas em punho ordenam a abertura do porta-malas e exigem documentos, verificam tudo atentamente, sempre em posição belicosa, de combate.

Mesmo com a nossa consciência tranquila, qualquer esboço de reação indevida seria pior para nós, apesar do abuso da autoridade policial. Pernas abertas, mãos na cabeça, o comandante da operação pergunta o que “fazíamos da vida”.

Quase em coro, o Ricardo e eu respondemos:

“Somos advogados”.

Era a nossa primeira vez, inesquecível. Tínhamos combinado, iríamos contar um para o outro como seria a primeira vez em que alguém indagaria sobre a nossa profissão, sem imaginar que estaríamos juntos, numa mesma e delicada situação.

Após tudo resolvido, procuramos saber naquela hora os motivos da abordagem. Eles disseram que a placa do ômega começa com a letra K, incomum naquela região e no Paraná, levando a suspeita de ser carro roubado e a caminho do Paraguai. Nós dois bem vestidos de terno, ainda que os paletós estivessem no porta-malas, tínhamos aparência bem apessoada para não levantar suspeita, o que não enganaria a esperta Polícia.

Tanto o Ricardo quanto eu certamente responderemos muitas vezes - advogados – e esperamos jamais ter que estar com as mãos na cabeça.

Olhos, Vistos do Cotidiano

Nem sempre se percebe a cacofonia – encontro ou repetição de sons desagradáveis ao ouvido. Na tevê, jogo de vôlei entre Brasil e Cuba, o narrador disse “Cuba lança a bola”. Seria preciso informar o que “balança”?

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