quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O SIGNIFICADO DA VIDA

"... A gente só é capaz de compreender o significado da vida quando olha a existência sob outra perspectiva..."

Depois de 7,5 milhões de anos de cálculos, o ultra computador desenvolvido exclusivamente por uma raça de seres estelares para responder qual é “o sentido da vida, do universo e de tudo o mais” finalmente dá sua resposta. Anunciada “com majestade e calma infinitas”, o Pensador Profundo – esse é o nome do computador, de acordo com o Guia do Mochileiro das Galáxias, escrito por Douglas Adams – fornece a chave que irá desvendar o principal enigma do cosmos. E a resposta dele para o sentido da vida é... 42. Isso mesmo, o número 42. O que suscita outras dezenas de milhões de perguntas, que podem ser resumidas numa só: “42 o quê?!?”

Esse é o problema. Para entender o sentido da vida – e, por enquanto, vamos admitir que ela tenha um –, é preciso compreender algo que não está diretamente contido na própria vida. Como o arco-íris, que não existe por si mesmo, mas que é apenas o resultado da interação entre nosso olho e a refração da luz nas gotículas de água, o significado da existência também nasce de uma parceria entre nós e aquilo que achamos que é a realidade. É uma atribuição ao que vivemos e experimentamos. Portanto, o número 42 como resposta, assim como a própria vida, pode não ter sentido nenhum. Somos nós que atribuímos, ou não, um significado para ele, com base no que vivenciamos e entendemos do mundo.

Por que será que precisamos tanto atribuir um valor especial para a vida? E quais os fatores que nos ajudariam a vivê-la mais plenamente? Bom, aí já dá para responder.

Quando comecei a refletir sobre esta reportagem, lembrei-me de Deus. Mais especificamente, das primeiras páginas do Gênesis. Depois de haver criado céus e terra, peixes, animais, florestas e o ser humano, Ele teve um momento de contemplação. Olhou para sua criação e viu que tudo aquilo era bom. Foi a primeira atribuição de sentido para a vida: a de que ela era simplesmente boa. Não importa se no pacote vieram dor de dente e uma vaga atrás da coluna na garagem do prédio. No geral, ela é boa e generosa. No particular, pode incluir problemas.

“Mesmo quando achamos que a vida não tem nenhum sentido, estamos atribuindo um sentido para ela: o de que a existência é absurda, caótica, sem significado ou coerência”, diz a psicóloga paulista Karen Jimenez. Bom, ela tem razão. Esse olhar já carrega um monte de sentidos, inclusive. Ao contrário de Deus contemplando sua criação, muitas pessoas acham que vida é ruim, injusta, desagradável e até negativa. E, para a maioria delas, essa apreciação é deprimente. “Ela pode levar a um desânimo total”, diz Karen.

Agora, sugere Karen, pergunte para uma pessoa que está vivendo uma grande paixão o que ela acha da vida. Ou a uma criança brincando num parquinho. Ela nem vai querer perder tempo em responder a essa questão, tão interessada que está em viver. “Quem acha que a existência não tem sentido é porque perdeu seu encantamento por ela. Está desapaixonado pela existência. E qualquer coisa que não nos apaixona automaticamente nos desinteressa.” Nessa condição, tudo fica cinzento, com cara de dia nublado. “Somos seres que precisam de significado, seja no trabalho, seja nos relacionamentos ou nos seus projetos.” O sentido ativa nossa emoção – como o nome diz, aquilo que nos move para a ação. “Ele nos devolve o prazer, o desejo de interagir, de criar”, diz Karen.

Um dos segredos, então, é se apaixonar novamente por ela, descobrir seu encanto. Esse estado de graça geralmente nasce de uma harmonia interior, essencialmente espiritual, que se traduz depois numa harmonia exterior. Como diz Sócrates, em Fedro, na sua pungente prece: “... ajudai-me a buscar a beleza interior e fazer com que as coisas exteriores se harmonizem com a beleza espiritual”. Para a maioria de nós, esse sentimento de plenitude surge quando sentimos que estamos realizando o propósito do que viemos fazer nessa vida, algo que é único e individual. Aí a existência se reveste de sentido e beleza. “Imagine que o único propósito da vida seja só sua felicidade – então a existência seria uma coisa cruel e sem sentido. Porém, seu intelecto e seu coração lhe dizem que o significado da vida é servir à força que o enviou o mundo. Então, quando isso acontece, a vida se torna uma alegria”, escreveu o russo Leon Tolstoi.

Por que será que funcionamos assim? Por que o absurdo e a falta de sentido da vida nos incomodariam tanto?

Uma teoria, por favor

Quando a vida viola nossa lógica e expectativa, quando ela foge daquilo que supomos que aconteceria, mergulhamos num sentimento que o filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard descreveu como uma inquietante “sensação do absurdo”. É algo tão desagradável, tão desorientador, que o cérebro imediatamente se prepara para desenvolver uma coerência para aquilo que nos tirou do chão. “Ficamos tão motivados em nos livrar dessa sensação que passamos a procurar significado e coerência em qualquer outro lugar”, diz Travis Proulx, pesquisador da Universidade de Santa Bárbara, na Califórnia, envolvido com estudos sobre como o absurdo molda o cérebro humano. Em entrevista ao jornal The New York Times, ele diz que cérebro é programado para identificar padrões e predizer o que está para acontecer com base neles. Os padrões nos dão um sentido, algo muito útil desde que o ser humano desceu das árvores e se colocou em contato direto com leões e outros predadores. Enfim, somos treinados para antever que isso mais aquilo só pode dar naquilo. Agora, imagine o que acontece quando a vida diz o contrário? De certa forma, enlouquecemos.

Além disso, o cérebro é reacionário. Ele “gosta” de padrões, de algo que se repete e que lhe permite fazer previsões, pois funciona a partir delas. E são justamente as sequências previsíveis que permitem a leitura de um significado. “Quando os padrões se rompem (por exemplo, quando alguém tropeça em algo inesperado, como uma poltrona de plástico no meio de uma floresta), imediatamente o cérebro passa a tatear por algo que faça sentido”, diz o pesquisador. Ou seja, passa a formular hipóteses, um dos passatempos prediletos da humanidade. Não nos conformamos facilmente com algo sem explicação.
Porém, mesmo quando estamos confusos e desesperados, e quando a vida parece não ter significado algum, algo pode ocorrer. As enfermeiras francesas Rosette Poletti e Barbara Dobbs, no livro Dar Sentido à Vida, falam da importância dos acontecimentos inesperados que podem mudar radicalmente nosso olhar sobre a existência, para melhor. “Mesmo numa vida que está indo à deriva, quando uma pessoa não leva mais adiante nenhuma busca de sentido, não acredita mais em seu futuro, não espera mais nada e quando nada mais tem significado para ela, sempre existe a possibilidade de uma reviravolta inesperada, surpreendente e, às vezes, milagrosa”, afirmam elas, que, inclusive, acompanharam muitos desses casos. O que as autoras afirmam é que o inexplicável pode sempre acontecer e mudar completamente uma convicção, uma situação, um jeito de ser. Isto é, algo improvável pode ocorrer e ser capaz de nos dar novamente um sentido à vida. É sempre bom ter essa possibilidade em mente.

Do Blog da Bernadete

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