Por Anatoli Oliynik
Os códigos morais, que vão desde as orientações religiosas até as orientações jurídicas, só funcionam se existir um tribunal interno dentro de cada um. Esse tribunal interno é a bifurcação da vontade. Se a bifurcação da vontade deixar de existir, a pessoa automaticamente deixará de ser um ser humano e nenhum código moral irá funcionar.
Um ser humano que não tenha dilemas morais é uma pessoa doente que caiu fora da espécie, porque não é possível viver sem dilema moral. Apenas os animais irracionais vivem sem dilema moral algum. O leão, por exemplo, é capaz de devorar os próprios filhotes recém-nascidos só para acelerar o retorno do cio da leoa devido a suspensão da amamentação. Para ele não há dilema moral, assim como para os demais animais irracionais.
Nós, humanos, embora torçamos para não ter nenhum dilema moral na vida, na realidade acontece o contrário: nós passamos a vida inteira vivendo dilemas morais. Alguns são completamente insolúveis. Como não sabemos o que fazer, o jeito de lidar com isso é procurar um código externo que possa dizer o que fazer. Um deles é o jurídico. O outro é o religioso, ou seja, fazer aquilo que Deus gostaria que fizéssemos. Esta segunda opção é a solução para qualquer dilema moral, vez que o código jurídico deveria, obrigatoriamente, derivar da moral religiosa, ou seja, o direito positivo deve derivar, sempre, do direito natural. Infelizmente não é o que acontece.
Os dilemas morais são de duas naturezas: verdadeiros e falsos. Os dilemas são verdadeiros quando eles têm uma natureza que se desdobra no tempo. Ao contrário, são falsos. Por exemplo, um dilema que não é moral: “Quem é mais bonito, o Shrek ou o Antônio Banderas?” Isso não é um dilema moral porque ninguém tem dúvida quanto a isso. A escolha surge automaticamente, embora algumas escolhas possam recair no outro.
Por outro lado, se a pergunta for “Coloco ou não coloco o meu filho no Colégio Militar?” A pessoa só vai saber se a decisão foi boa ou não, daqui a vinte anos, ou seja, no tempo. Portanto, os dilemas morais se caracterizam por se desdobrarem no tempo. Assim, a pessoa nunca pode ter certeza se tomou a melhor decisão no ato da decisão. Só o tempo dirá. É por isso que existem códigos morais externos que decidem pela pessoa quando ela não sabe o que fazer.
Se a pessoa não está feliz com os códigos morais externos, sempre haverá a orientação maior. Em última análise, façamos aquilo que Deus quer que cada um faça. Mesmo assim, e independente da escolha, a pessoa não se livrará da dor de enfrentar o dilema moral, por mais que ela utilize um desses três estratagemas:
1. Fingir que para você não vale esse código, mas outro;
2. Fingir que você não é você;
3. Fazer de conta que não há código moral nenhum.
Pessoa alguma irá obter sucesso com nenhum dos três estratagemas, porque no fundo, o que resta em última análise é tomar a decisão. Essa decisão será sempre dolorosa, mas se for feita para o lado do bem, será muito melhor do que fazê-la para o lado do mal.
Quando estudamos a ética, a moral ou qualquer outra coisa que o valha, não dá para perder de vista essa visão que acabo de expor, senão corremos o risco de ficar nessa conversinha mole de “ética disso”, “ética daquilo” etc. Na realidade as pessoas perderam completamente a idéia e a verdadeira noção de ética para submeterem a ética a uma espécie de colegiozinho do “politicamente correto”, ou seja, seguir um conjunto de orientações de uma cartilhazinha elaborada por um bando de psicopatas que se julga acima do bem e do mal. Perdeu-se completamente a noção de que esse assunto é de consciência humana.
A noção de que há um dilema moral só pode ser alcançada se a pessoa fugir das três escapatórias amplamente utilizadas nos tempos atuais: a) fingir que aquele código não vale para ela; b) fingir que não é com ela; c) fazer de conta que não há código moral algum. Esses são os três tipos de mentira que as pessoas estão utilizando o tempo todo. Elas “grudam” nessas três regras escapatórias e criam uma realidade à parte que na verdade não é realidade nenhuma, mas apenas uma fantasia que as pessoas assumem como aspectos da realidade.
O problema fundamental que as pessoas têm, é a incapacidade para destruir a confusão do processo que envolve a noção de realidade e fantasia. Se não for promovida a distinção entre o que é realidade e o que é fantasia, o problema permanecerá insolúvel e a única escapatória para livrar-se da dor do dilema moral, será viver na mentira dos estratagemas ou assumindo o papel do leão.
O sujeito que faz uma coisa ou outra é uma pessoa que caiu já fora da espécie humana e não tem consciência disso.
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