No século XX foram criados vários mitos da ficção moderna, alguns se tornaram ícones do universo da fantasia atual, atingindo a popularidade em todo o planeta, transformando-se em heróis contemporâneos. A literatura, as revistas em quadrinhos, o cinema e a televisão foram os principais responsáveis pela difusão e perenidade desses mitos modernos, destacando-se Drácula, surgido no final do século XIX, Super Homem e Batman, vindos das histórias em quadrinhos; e Tarzan, o homem macaco, rei das florestas africanas.
A bem-sucedida trajetória da lenda de Tarzan veio das instigantes e originais páginas do romance “Tarzan of the Apes”, escrito pelo norte-americano Edgar Rice Burroughs. Fazendo parte das edições populares vendidas em bancas de jornais, o livro foi lançado na íntegra em 1912, na edição de outubro da revista “All-Story”. A originalidade da lenda alcançou grande sucesso, transformando o seu autor em um dos escritores mais famosos do século XX.
O sucesso de Tarzan fez com que a personagem aparecesse em mais de vinte e quatro livros e em vários contos avulsos. Sua epopeia saltou das páginas folhetinescas para as telas cinematográficas, em 1918, em plena era do cinema mudo. Desde então, grandes filmes foram produzidos, dando diversos rostos e corpos ao rei dos macacos. Em 1929, Harold Foster introduziria o herói no mundo das revistas em quadrinhos, ampliando ainda mais a difusão da figura carismática de Tarzan.
Tarzan, nobre e rico herdeiro de uma tradicional família inglesa, têm os pais mortos na selva quando ainda é um recém-nascido, sendo criado por um bando de macacos, crescendo como se fosse um deles. Seu nome foi dado pelos macacos, que significa “Pele Branca”. É a história do homem branco que domina a selva inóspita, tornando-se o seu rei e senhor, numa alusão metafórica à conquista da África, último continente a ser colonizado pelos europeus. É força civilizadora européia sobrepondo-se sobre as civilizações primitivas africanas, dominando a selva e os seus imponentes e majestosos componentes. É a volta do homem civilizado aos seus instintos primitivos e, principalmente, a visão original e arrebatadora de um autor que nunca foi à África.
A Lenda do Homem-Macaco
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Lex Barker |
A história elaborada por Edgar Rice Burroughs gira em torno de John Clayton III, ou Lorde Greystoke, herdeiro de uma tradicional família da nobreza inglesa. Nascido durante uma expedição dos pais na África tropical, o pequeno John perdeu abruptamente os pais quando ainda era um bebê de colo. Após o assassínio do pai por um gorila, a criança sobrevivente é levada por uma fêmea de macaco, que o adota como filho, alimentando-o e ensinando-lhe a arte da sobrevivência dos primatas no coração da selva. Assim, o pequeno John cresce no meio de um grupo de macacos ferozes, como se fosse um deles, assumindo-lhes os hábitos e instintos naturais de sobrevivência.
Ao desenvolver sua instigante trama, Edgar Rice Burroughs sabia que iria precisar de um nome diferente e ressonante para rebatizar John Clayton III.
Primeiro pensou em Zantar, mas não gostou do som da pronúncia. Outros tantos vieram: Ugh, Tublat-Zan... até que chegou em Tarzan. O nome pareceu-lhe perfeito.
Criado por macacos no coração da selva africana, o nobre senhor e órfão inglês teve o seu nome alterado pelos próprios símios, que segundo Burroughs, queria dizer “Pele Branca”.
Tarzan, o homem-macaco, tem um desenvolvimento mental humano, apesar do aprendizado animal que se lhe foi estabelecido. Sentindo-se o patinho feio dos seus “irmãos” símios, ao crescer, seus instintos humanos faz com que se torne o rei da sua tribo de macacos.
Tarzan vai descobrir a sua verdadeira condição humana, as suas verdadeiras raízes e real história, ao estabelecer contatos com a civilização de exploradores brancos da África. Aos poucos, a sua deficiência de fala e linguagem humana vai dando passagem às lições civilizadoras que se lhe serão administradas pela bela Jane Porter, por quem se irá apaixonar e descobrir a sua essência de homem.
Ao relacionar-se com os homens e a civilização que o gerara, Tarzan viverá o conflito da sua alma humana e da sua concepção símia de ver o mundo. Lutará contra a natureza do que se tornou e do mundo de onde foi abruptamente arrancado quando criança. Seus sentimentos por Jane opõem-se à liberdade selvagem que se lhe assola a existência. O jovem inadaptado sente que a sua índole silvestre pode prejudicar a amada. No fim de “Tarzan of the Apes”, o jovem John Clayton III renuncia ao título e ao amor de Jane, preferindo ser o livre rei dos macacos, tendo a selva como palácio e os símios como súditos.
Edgar Rice Burroughs
Publicado em uma revista, “All-Story”, em 1912, “Tarzan of the Apes”, só teria a sua primeira versão em livro em junho de 1914, quando uma pequena editora, AC McClurg & Co., aceitou publicá-lo, vendendo-o ao preço de dois dólares cada exemplar. Esta edição tem, nos dias atuais, um valor incalculável.
A história de Tarzan empolgou leitores do mundo inteiro, fazendo com que Edgar Rice Burroughs (foto) escrevesse mais vinte e quatro livros, além de diversos contos avulsos. A paixão dos leitores por “Tarzan of the Apes” esbarrava-se no final do livro, odiado por todos por causa da renúncia de Tarzan ao amor de Jane. Para contornar o desafeto dos leitores, Edgar Rice Burroughs decidiu que Jane iria morar com Tarzan na selva, como casal, no romance seguinte, “The Return of Tarzan”, história publicada em 1913.
Além dos vinte e quatro livros com uma história completa em cada um, Edgar Rice Burroughs publicou, em 1936, “Tarzan and the Tarzan Twins”, que trazia as histórias “The Tarzan Twins” e “The Tarzan Twins With Jad-Bal-Ja, The Golden Lion”.
Vários escritores escreveram livros em cima do herói de Burroughs, entre eles Philip Jose Farmer, Barton Werper e Fritz Leiber.
Tarzan no Cinema
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Johnny Weissmuller |
O sucesso da história de Burroughs fez com que o cinema se interessasse por ela. Ao ganhar vida na grande tela, o mito de Tarzan seria difundido por todo o planeta, tornando-se um ícone das lendas contemporâneas. Mais tarde, a televisão tomaria para si as aventuras de Tarzan, popularizando-o ainda mais.
No cinema, a saga de Tarzan estreou no dia 27 de janeiro de 1918, no Brodway Theater de Nova York. “Tarzan, O Homem Macaco” (Tarzan of the Apes), trazia o ator Elmo Lincoln no papel título e Enid Markey como Jane. Em plena era do cinema mudo, Tarzan era apresentado com sucesso às grandes plateias. Apesar do repúdio de Burroughs à escolha do ator, por considerá-lo pouco atlético, Elmo Lincoln faria ainda “O Romance de Tarzan” (1918), além do seriado “As Aventuras de Tarzan”, em quinze episódios, estreado em 1921.
Outras três séries foram produzidas na época do cinema mudo: “O Filho de Tarzan”, em 1920, constituído de quinze episódios, tendo P. Dempsey como protagonista; “Tarzan, O Poderoso” e “Tarzan, O Tigre”, em 1929, tendo ambas quinze episódios protagonizados por Frank Merrill. Duas películas encerrariam a fase do herói no cinema mudo: “A Vingança de Tarzan”, em 1920, com Gene Pollar; e, “Tarzan e o Leão de Ouro”, em 1927, com James H. Pierce.
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Gordon Scott |
Em 1932, a Metro-Goldwyn-Mayer produziu “Tarzan, O Filho das Selvas”, primeiro filme sonoro do herói. Para protagonista foi escolhido um nadador olímpico, Johnny Weissmuller, que se tornaria o mais famoso intérprete do homem-macaco. O ator introduziria o famoso grito de vitória de Tarzan, tornando-se um ícone da personagem, jamais se afastando dos sucessores de Weissmuller. O grito era uma mixagem dos sons de um barítono, uma soprano e cães treinados.
Johnny Weissmuller viveria Tarzan no cinema por doze filmes, sendo o último, “Tarzan e as Sereias”, em 1948. Várias atrizes viveram ao seu lado o papel de Jane, sendo Maureen O’Sullivan a mais famosa delas, aparecendo em seis filmes. O ator sofreu a censura da época nos trajes que usava, tendo o tamanho das suas tangas aumentadas a cada filme. Sob o rigor da época, Tarzan e Jane não puderam ter filhos, pois não eram legalmente casados. O personagem Boy foi introduzido em 1939, no filme “O Filho de Tarzan”. Vivido pelo ator Johnny Sheffield, Boy era adotado por Jane e Tarzan. Nos livros originais, o casal tinha um filho legítimo, Korak, que se tornava adulto nos últimos romances.
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Mike Henry |
Já velho para o papel, Johnny Weissmuller foi substituído por Lex Barker, que não obteve a mesma popularidade do seu antecessor. Gordon Scott foi o seu sucessor, sendo considerado pelos críticos o melhor intérprete do personagem de Edgar Rice Burroughs. Jock Mahoney e Mike Henry foram os Tarzans que alcançaram relativo sucesso nas grandes telas, sendo o último, o mais parecido com o Tarzan dos desenhos em quadrinhos de Burne Hogarth.
No decorrer dos anos, o cinema deixou de produzir as aventuras do homem-macaco. A mais infame adaptação do cinema foi realizada por John Derek, em 1981, “Tarzan, O Filho das Selvas”, filme erótico que transformou o herói das selvas em coadjuvante e mostrou as apelativas provocações da limitada atriz Bo Derek, numa total deturpação da saga cinematográfica do mito.
Em 1984, “Greystoke, A Lenda de Tarzan”, trazia Christopher Lambert no papel título, sendo a última grande produção do cinema da personagem de Edgar Rice Burroughs.
Na televisão, o ator Ron Ely viveu, a partir de 1966, uma série de sucesso, que teve cinquenta e sete episódios, sendo alguns dos episódios adaptados para o cinema.
A sétima arte foi a grande responsável pela difusão do mito de Tarzan pelo mundo, ampliando em imagens as páginas de Edgar Rice Burroughs, muitas vezes fugindo do herói original proposto pelo autor, acrescentando-lhe novas características, impregnando-lhe princípios das morais vigentes em cada época que as aventuras foram rodadas.
Tarzan nos Desenhos em Quadrinhos
Fazendo o sentido contrário dos heróis Batman e Super Homem, oriundos das bandas desenhadas, Tarzan deixou o mundo literário, passou pelo cinema, chegando aos quadrinhos, em 1929.
Harold Foster foi o primeiro a desenhar Tarzan, em 1929, em sessenta tiras publicadas diariamente em jornais. Quando Foster se recusou a continuar a desenhar Tarzan, foi substituído por Rex Maxon, que fez as tiras do herói distribuídas pelos jornais do mundo. Ele ficaria até 1931, quando Harold Foster retornou, passando a desenhar o herói em páginas dominicais coloridas.
Foster foi impecavelmente fiel aos livros de Edgar Rice Burroughs.
A partir de 1947 Harold Foster foi substituído por Burne Hogarth, considerado o melhor e maior ilustrador de Tarzan, mostrando-o em formas de músculos perfeitos, introduzindo-o em paisagens exóticas e vibrantes. O Tarzan de Burne Hogarth ganhou adeptos das revistas em quadrinhos, tornando-se um ícone da banda desenhada. Ele seria substituído por Bob Lubbers, em 1950, voltando triunfalmente em 1972, numa versão de Tarzan em forma de livro.
Nas histórias em quadrinhos, vários foram os artistas que desenharam o herói de Edgar Rice Burroughs, entre eles o genial Russ Manning, Gaylord DuBois, Joe Kubert, Dan Barry, John Celardo, John Lehti, John Buscema, Jesse Marsh, Reinman e Ruben Moreyra.
O cinema e a televisão produziram vários filmes e séries de desenhos de animação de Tarzan, sendo algumas reproduções fiéis aos livros originais, outras nem tanto. Destacam-se as produções dos estúdios Filmation e dos estúdios Disney. Na primeira década de 2000, os filmes de animação foram os maiores investimentos da sétima na arte no mito do homem-macaco.
Seja qual for o veículo que retratou a vida de Tarzan, o mito jamais fugiu do proposto, o homem branco que criado por símios, venceu o meio inóspito, tornando-se rei e senhor absoluto não só de animais ferozes, como de civilizações indígenas que se lhe cerceavam o caminho, numa visão às vezes maniqueísta, de que a civilização branca impera sobre as outras, um paradigma refletido do ponto vista colonial, não deixando de ser uma triste e constatada verdade no coração da África. Sob o ponto de vista lúdico, Tarzan é um dos mais fascinantes heróis do mundo contemporâneo, uma reprodução viva dos velhos mitos da antiguidade. Enquanto Batman e o Super Homem lutam contra os inimigos e vilões urbanos, Tarzan luta com os inimigos da selva, da natureza insubmissa, mesmo quando parece curvar-se diante da suposta supremacia humana.
Um comentário:
meu pai ate que era bonito
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