domingo, 30 de dezembro de 2012

LENY EVERSONG! UM FURACÃO EM LAS VEGAS

Por Luiz Antonio Domingues* – in Orra Meu!

São muitos os exemplos de artistas que caem em completo esquecimento, neste Brasil sem memória. 
Pouco tempo atrás, por exemplo, escrevi sobre a Tuca, uma artista que caiu no limbo da estória musical brasileira, a despeito da qualidade de seu trabalho artístico, inclusive de alcance internacional, onde foi parceira de Françoise Hardy com composições e duos vocais.
O caso de Leny Eversong é muito parecido, por se tratar de uma grande intérprete, que fez carreira internacional, gravou muitos discos e desapareceu sem deixar vestígios, com pouquíssimas pessoas se lembrando dela hoje em dia.
Leny nasceu em Santos, litoral paulista, no dia 1° de setembro de 1920, mas foi batizada como Hilda Campos Soares da Silva.
Com apenas 12 anos de idade, venceu um concurso de talentos mirins na Rádio Clube de Santos e foi imediatamente contratada como artista do cast fixo da emissora, apesar de ser apenas uma menina.
Sua especialidade inicial era cantar Fox, uma vertente jazzística norte-americana e chamava a atenção o fato dela mesmo sendo pequena, cantar em inglês com perfeição, sem sotaque. 
Mas calma, leitor, que nesse aspecto tem estória boa para contar, que vou deixar para os próximos parágrafos.
Um pouco mais madura, mas ainda adolescente, foi contratada pela Rádio Atlântica de Santos e prosseguiu cantando, já usando o nome artístico de Leny Eversong. 
Inevitavelmente, mudou-se para São Paulo em 1937 e tornou-se crooner em casas noturnas da capital paulista.
Paralelamente, também foi cantora fixa de emissoras de rádio da capital.
Seu repertório era sempre calcado no cancioneiro norte-americano e também no francês, onde os elogios à sua pronúncia, eram efusivos.
Já nessa fase entre os anos trinta e cinquenta, Leny já havia visitado e encantado o público argentino.
Em 1952, gravou seu maior sucesso, o Fox, "Jezebel", que tocou bastante nas rádios e lhe deu oportunidades ainda maiores na carreira.
Como por exemplo, Leny excursionou pelos Estados Unidos, no final da década de cinquenta. E nessa primeira ida à América, gravou um disco: "Leny Eversong na América do Norte", acompanhada da orquestra do maestro Neal Hefti.
Daí em diante, Leny não parou mais de viajar à América. Era óbvio que encantaria os americanos pelo seu talento, mas certamente pela ótima pronúncia que os confundia ao ponto de não perceberem que ela era brasileira, latina portanto.
Agora posso revelar sua incrível estória em relação aos idiomas inglês e francês.
Leny não entendia absolutamente nada do que cantava em tais idiomas!
Sua capacidade auditiva era incrível, pois conseguia memorizar a fonética das palavras ao ponto de cantá-las com pronúncia perfeita, sem sotaque, de uma maneira que americanos ou franceses não desconfiassem que ela fosse estrangeira e como agravante, não compreendesse os dois idiomas.
Isso gerou diversas situações engraçadas em sua carreira, contudo.
A estratégia era a de não dar entrevistas para jornalistas, com o seu empresário apenas respondendo as perguntas. Leny respondia laconicamente apenas "Yes", “All Right","OK"... hilário!
Claro que após tantas viagens, já nos anos sessenta, ela acabou dominando o idioma inglês, principalmente.
E foram muitas, de fato!
Na década de sessenta, Leny esteve em cartaz em Las Vegas, por oito vezes. E também cantou em muitas ocasiões em Nova York e Paris.
Muitos críticos chegaram a argumentar que Leny era invisível no Brasil, apesar de ter tido a proeza de ficar famosa na América e sem colocar cestos de frutas na cabeça, numa alusão à Carmem Miranda.

Gravou vários discos: “Em Foco”, “A Voz de Lenny Eversong”, “Ritmo Fascinante”, "A Fabulosa", "A Internacional" etc. 
Excursionou por toda a América Latina também e nos anos de ouro dos musicais na TV brasileira, durante os anos sessenta, era figura carimbada.
Aliás, são desses programas sessentistas, as minhas mais vívidas lembranças de Leny Eversong.
Mesmo sendo criança e não tendo um senso crítico nada apurado, eu simpatizava muito com ela. Achava-a carismática, com aquele vozeirão de Diva do Jazz, cantando num idioma estrangeiro, mas encantando a plateia.
Leny era bem obesa e por conta disso contraiu diabetes, o que colaborou para minar sua carreira a partir do início dos anos setenta.
Mas o fator que alavancou a decadência de sua carreira e de sua vida, infelizmente, foi outro.
Conhece aquela clássica piada do marido que um belo dia diz à esposa que vai no bar comprar um maço de cigarros e desaparece?
Pois infelizmente foi o que ocorreu com Leny, pois seu marido foi buscar um cigarro, sabe Deus aonde.
Amigos queridos como Luiz Vieira e Adelaide Chiozzo lhe deram apoio, mas foi o cantor Agnaldo Rayol, seu melhor amigo, quem lhe deu o ombro, hospedando-a em sua casa no momento agudo da depressão, por volta de 1970. 
Mas nem com esse apoio de amigos, Leny conseguiu driblar a tristeza, e dessa maneira, foi definhando, largou a carreira e morreu esquecida no ostracismo em 1984, derrotada pela diabetes.
Eu lamento muito o mau hábito do brasileiro em geral em não dar valor à seus artistas. Não é a primeira matéria que resmungo essa minha bronca com essa característica negativa de nosso povo e por isso mesmo, faço o que posso, ao meu alcance, para reverter esse quadro terrível.
Leny Eversong é mais um exemplo de artista super talentosa e que está condenada ao limbo da história.
Se depender de mim, no entanto, essa situação começa a mudar a partir desta matéria.
Saudade da Leny, uma artista que tinha algo além do talento vocal : tinha uma simpatia contagiante.
* Luiz Antonio Domingues (músico das bandas PEDRA, Ciro Pessoa & Nu Descendo a Escada, Kim Kehl e os Kurandeiros).   

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