quinta-feira, 21 de julho de 2011

CHARQUEADA DE SANTA THEREZA

Hiram Reis e Silva, Bagé, RS, 21 de julho de 2011.

Oh homem, que tudo aniquilas e que tudo destróis, esta é a tua obra verdadeira e eterna: sangue, sangue, sangue - em toda parte sangue. Gotejam os rubros filetes nestas galerias de carnes. Minas de carnes! Carne! Carne! Por toda a parte: carne!... No vapor dos corpos dissecados correm as zorras cheias de cadáveres do lugar da matança para o da dissecação. Dentro do tórax como prisioneiros, estão acocorados os negros carniceiros por detrás das costelas que semelham grades. (...) Das trevas das tormentas fumegantes eles arrastam bandeiras de carne que desfraldam ao vento! Que empilham em montes altos como casas! Adiante, na cerca de arame farpado balouçam trapos nus, exalando vapores. Sob a ardência do sol. Corações! Corações! - agora trapos sujos! Não palpitáveis ainda ontem, no conforto da vida? Não palpitáveis ainda há pouco, na intuição da morte, corações? Andrajos sujos!...

(Harnisch - Nas Minas de Carne)

Fui convidado para realizar a palestra de abertura da Semana de Formação Continuada para os professores da rede estadual de Bagé. Foi um prazer enorme, na manhã de 18 de julho, repassar aos mestres a nossa amazônica vivência e ter a oportunidade de visitar esta bela e progressista cidade da campanha gaúcha que com os olhos voltados para o futuro não descura de seu valoroso passado. Aproveitamos a semana em que se festejam os 200 anos de Bagé para conhecer um pouco de sua história, um dos locais que mais chamou nossa atenção foi o projeto de revitalização do complexo da “Vila de Santa Thereza”.

Antônio Nunes de Ribeiro Magalhães

O Visconde de Magalhães foi um visionário e dinâmico comerciante, industrialista e criador de gado cuja história está ligada indelevelmente ao desenvolvimento econômico do Município de Bagé. Filho de Joaquim Nunes e Joaquina Rosa de Magalhães nasceu nos Castelões de Cepeda, freguesia portuguesa do Conselho de Paredes, no dia 5 de outubro de 1841. Desde cedo sentiu a necessidade de buscar novos horizontes onde:

pretendia dar largas ao seu gênio altamente empreendedor e ativo, sendo o Brasil o país dourado dos seus belos sonhos de criança, para o qual embarcou, contando doze anos de idade, depois de aprender as primeiras letras na escola primária de sua terra”. (Fonte: Cláudio Antunes Boucinha)

Nos idos de 1853, Magalhães, com 12 anos de idade, embarcou sozinho no Veleiro Íris, com destino ao Brasil. Desembarcou no Porto de Rio Grande onde foi contratado como caixeiro em um dos armazéns do Mercado Público de Rio Grande. Mais tarde foi trabalhar com Delabary do qual viria a se tornar sócio e algum tempo depois fundou a firma “Alegre & Magalhães” que dissolveu em 1872.

Cronologia Histórica

1872 mudou-se para o “Pirahy”, onde constituiu a firma “Magalhães & Souza”, associado a Francisco Loureiro de Souza, operando no ramo de “secos e molhados”. Poucos anos depois, montou uma próspera empresa que fechou antes de mudar-se para Bagé onde continuou se dedicando ao mesmo ramo de negócios incorporando a ele produtos pecuários.

1881 resolve aplicar os lucros obtidos no comércio na compra e venda de gado.

1885 em 24 de novembro a Junta Comercial de Porto Alegre concedeu-lhe a carta de comerciante matriculado.

1888 em 17 de setembro foi nomeado Vice-cônsul de Portugal, cargo que ocupou até sua morte.

1893 tornou seu filho primogênito Antonio Magalhães sócio na casa de comércio, constituindo a firma Magalhães & Filho.

1894 fundou a charqueada de “Cotovelo” que foi liquidada, em 1897.

1897 fundou o “Saladero Santa Thereza” com instalações mais amplas com capacidade de abater 45.000 reses por safra. Com a intenção de expandir os negócios comprou alguns hectares a sudoeste da cidade, à margem da estrada de ferro, onde inaugurou, em 21 de fevereiro, a “Charqueada de Santa Thereza” em homenagem à sua esposa Thereza Pimentel Magalhães.

1898 inaugurou em Santa Thereza um sistema de iluminação a gás acetileno.

1899 introduziu em Bagé um lote de animais da raça Durham, importados da Inglaterra.

1901 a Charqueada de Santa Teresa possuía uma caldeira a vapor, linha férrea para transporte de resíduos, luz elétrica fornecida por uma pequena usina hidrelétrica, serraria a vapor, oficina de ferraria, tanoaria, vila operária, restaurante, armazém e padaria. A charqueada abatia, na safra, 480 reses por dia e empregava 180 pessoas.

1904 arrendou a “Companhia Industrial Bajeense”. Os dois estabelecimentos chegaram a abater, numa safra, 94.600 animais. Construiu, entre as duas charqueadas, uma avenida arborizada, a “Boulevard 16 de Outubro” e uma linha de bondes.

1906 em 01 de setembro foi agraciado com o título de Visconde de Ribeiro Magalhães, cuja carta foi dada e assinada por Dom Carlos, Rei de Portugal, no Paço das Necessidades, em Lisboa.

1907 comprou a “Companhia Industrial Bajeense” e mudou sua denominação para “Charqueada Industrial” (atual Mercosul).

1908 a Charqueada tinha instalações suficientes para abrigar mil trabalhadores, embora sua população efetiva tenha chegado a 894 empregados. A charqueada possuía sapataria, barbearias, alfaiataria e uma capela dedicada à “Santa Thereza”. Neste mesmo ano foi inaugurado o teatro Santo Antônio.

O Teatro Santo Antonio possuía seis camarins, dezessete camarotes, cinquenta cadeiras, gerais, mesa de bilhar, piano, bilheteria, copa, piano e teto com medalhões de Carlos Gomes, Donizzetti, Bellini, Auber, Ariza, Gounod, Puccini, Franchetti, Verdi, Marchetti, Feiullet, Barrou e Chopin. Havia um grupo de Arte Dramática, constituído pelos operários da Charqueada.

Inaugurou, no dia 15 de outubro, uma pequena capela em homenagem a Santa Thereza D’Ávila, cumprindo uma promessa de sua esposa Thereza. O órgão do coro da capela e todos os paramentos da capela, altar, a custódia, cravejada de rubis e esmeraldas, foram importados de Paris e o altar-mor da Bahia. O Dr. Júlio Mascarenhas de Souza foi contratado para ser o diretor do pequeno hospital denominado “Sociedade Beneficente Santa Teresa” que dispunha de uma sala para cirurgias e enfermaria. Construiu um colégio misto para 60 alunos, cujo professor era remunerado pela Intendência Municipal.

Entre a mansão dos Magalhães e a capela foi escavado um fosso em volta de uma pequena ilha onde foi construído um coreto. O fosso abrigava peixes ornamentais e o coreto era usado para a apresentação de bandas. Havia uma banda formada pelos operários da Charqueada denominada “Lira Santa Thereza”, que fazia suas apresentações no coreto e no teatro do local.

1912 vendeu “Charqueada Industrial” e “Charqueada de Santa Thereza” a “Anglo-Brazilian Meat Company Limited”.

1914 Magalhães possuía 2.200 vacas leiteiras, em Santa Teresa e na estância Rio Negro. A partir dessa criação, construiu uma indústria de laticínios, produzindo queijos, manteiga, leite pasteurizado, leite medicinal, cujo administrador era o senhor Castro Garavia.

1916 o Visconde foi um dos maiores proprietários de terras do Rio Grande do Sul. Possuía várias estâncias, seu rebanho bovino ultrapassava as 30.000 cabeças. Possuía trinta prédios em Bagé, Rio Grande, Cassino, São Paulo e Portugal além de 32.600ha em terras que lhe conferiam o status de segundo maior contribuinte do Estado em imposto territorial.

1913 introduziu 20 reprodutores puros, além de 68 ovelhas.

1923 com a falência do Visconde parte dos seus bens foram vendidos para saldar dívidas.

1926 no dia 11 de janeiro faleceu o Visconde de Ribeiro Magalhães.

Centro Histórico Vila de Santa Thereza

Fonte: O Informativo do Vale

A iniciativa de Ierecê Belmonte Móglia em evitar a destruição de uma bonita capelinha erguida pelo português Antônio Nunes de Ribeiro Magalhães, o Visconde de Magalhães, no complexo de prédios que começou a construir em 1897 para o funcionamento da charqueada de Santa Thereza, há oito anos deu origem à Associação Pró-Santa Thereza. Seu objetivo, resgatar e captar recursos com a iniciativa privada para revitalizar a área. Localizada a sete quilômetros do centro de Bagé, no bairro de Santa Thereza, é um conjunto de grande beleza natural e arquitetônica, que deve se transformar em centro cultural e turístico até o final de 2008. Para uma das coordenadoras do projeto, Eliane Simões Pires Pacheco, a história da Vila de Santa Thereza está associada à figura ímpar do Visconde de Ribeiro Magalhães.

Ao vir para o Brasil com apenas 12 anos de idade, personagem de grande tenacidade e marcante capacidade empreendedora, foi capaz de construir, em plena Campanha do século XIX, um aglomerado urbano que oferecia moradia, cultura, lazer e consumo aos operários de suas indústrias de carne. No complexo da Charqueada Santa Thereza, em sua residência, o visconde recebia pessoas ilustres, como o escritor Olavo Bilac. Ele mantinha na "Vila Operária" cerca de mil pessoas, entre trabalhadores e seus familiares, em casas de alvenaria. Uma usina produzia luz elétrica. Havia ainda hospital, armazém, alfaiataria, carpintaria, fábricas de adubo e de ladrilho hidráulico e uma estação de trem. A pequena capela católica foi construída em homenagem a Santa Thereza D’Ávila, para cumprir promessa feita por dona Thereza, esposa do visconde. O dia da inauguração, 15 de outubro de 1908, foi escolhido por ser o de nascimento da santa. O projeto de revitalização do complexo, elaborado pelo arquiteto e professor da Uniritter, Flávio Kiefer, passa pela restauração da capela e do coreto, além de tratamento paisagístico e luminotécnico da área. Também serão construídos um teatro em estilo contemporâneo para cem pessoas e um memorial, montado na casa em que morava um dos filhos do visconde. Nele estará registrada a história da charqueada e de seus habitantes. Os recursos para as restaurações são de diversas empresas, através das leis Rouanet e de Incentivo à Cultura.

Fontes: claudioantunesboucinha.blogspot.com

cidadebage.blogspot.com

Blog e Livro

Os artigos relativos ao “Projeto–Aventura Desafiando o Rio–Mar”, Descendo o Solimões (2008/2009), Descendo o Rio Negro (2009/2010), Descendo o Amazonas I (2010/2011), e da “Travessia da Laguna dos Patos I (2011), estão reproduzidos, na íntegra, ricamente ilustrados, no Blog http://desafiandooriomar.blogspot.com.

O livro “Desafiando o Rio–Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na Livraria EDIPUCRS – PUCRS, na rede da Livraria Cultura (http://www.livrariacultura.com.br) e na Livraria Dinamic – Colégio Militar de Porto Alegre. Pode ainda ser adquirido através do e–mail: hiramrsilva@gmail.com.

Para visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
http://books.google.com.br/books?id=6UV4DpCy_VYC&printsec=frontcover#v=onepage&q&f=false.

Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva

Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA); Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS); Vice-Presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil/Rio Grande do Sul; Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS); Colaborador Emérito da Liga de Defesa Naciona.

Site: http://www.amazoniaenossaselva.com.br

E–mail: hiramrs@terra.com.br

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