quinta-feira, 30 de agosto de 2012

OS SERTÕES

Por Eduardo Prado

Nos sertões de Minas Gerais e da Bahia, na região em que se juntam os territórios destas duas antigas províncias, nos meses da seca, que ali vai de abril a novembro, a paisagem é uma verdadeira surpresa para o europeu acostumado à ideia convencional da natureza entre os trópicos.
A sombria e verde alfombra das florestas misteriosas, enredadas de liames enlaçantes, esmaltada das cores das orquídeas fantásticas, as inclinadas palmeiras por onde trepam macacos, o fundo ora escuro, ora violentamente iluminado de clareiras, onde luzentes parecem boiar, no seu voo pesado e lento, as grandes borboletas azuis… toda esta paisagem tropical, que os viajantes pintam e que a cenografia vulgariza, tudo isso é desconhecido naqueles centros do planalto brasileiro que ficam à direita do rio São Francisco. Os trópicos nem sempre são tropicais.
O viajante corta pela estrada dura e pedregosa, que em longuíssimas curvas, ou em retas infinitas, atravessa os tabuleiros intermináveis, em que a vegetação escura, meio seca, espinhosa se enreda numa compacta massa, ou rareada, que alcança os joelhos e os peitos das mulas. Os pequenos espinheiros, as mimosas e as acácias rasteiras, que parecem, às vezes, pinheiros de Liliput, à beira da estrada, são enovelados de penugens brancas, que lembram a neve e a geada. É o algodão, arrancado, em fiapos, às cargas pesadas de algodão em rama, que por ali transportam, em tropas, as mulas tangidas, em lotes, pelos tropeiros e precedidas da mula madrinha, que ajaezada de vermelho e tintinabulante de guizos e sinetas à cabeçada, avança lentamente, marcando o compasso à marcha da caravana.
Por centenas de léguas pode o viajante, no sertão, seguir o caminho das tropas que traficam entre Bahia e Minas; Omo os grãos de milho do conto do pequeno polegar, os novelinhos de algodão, presos às plantas do campo e dos cerrados, podem indicar o rumo do caminhante. (in Literatura Brasileira).
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Eduardo Paulo da Silva Prado mais conhecido como Eduardo Prado, nasceu São Paulo a 27 de fevereiro de 1860 e faleceu em São Paulo a 30 de agosto de 1901, foi um advogado, jornalista e escritor brasileiro, membro fundador da Academia Brasileira de Letras e um dos mais importantes analistas da vida política do Brasil.
Monarquista convicto, era amigo do Barão do Rio Branco, e colaborador da edição de Le Brésil em 1889, obra publicada por ocasião da Exposição Internacional de Paris, comemorativa do centenário da Revolução Francesa. Travou amizade com os escritores portugueses Eça de Queirós, Ramalho Ortigão e Oliveira Martins, tendo sido, apesar de 15 anos mais novo, íntimo amigo do primeiro.
Era filho de Martinho da Silva Prado e de Veridiana da Silva Prado, de tradicional família paulista. Ocupou-se desde a mocidade com estudos históricos. Formou-se em Direito na tradicional Faculdade de São Paulo, turma de 1881. Na época, já era colaborador assíduo do Correio Paulistano, dirigido por seu irmão Caio Prado, onde assinava artigos de crítica literária e política internacional.

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