Nada como um dia depois do outro para rirmos um pouco. Mentira alguma foi mais prejudicial à América Latina que o mito da revolução cubana. Instalou-se na ilha uma ditadura comunista que levou os cubanos a um nível de miséria desconhecido nos dias de Fulgencio Batista. Castro alegava na época que a Cuba de Batista era um bordel dos Estados Unidos. Com Castro, o bordel internacionalizou-se. Virou bordel do mundo todo. A tal ponto que, interrrogado porque as universitárias se prostituíam em Cuba, defendeu-se: “Nada disso. É que em Cuba até as prostitutas têm nível universitário”. Não estou fazendo piada. Isto foi dito pelo ditador.
Em 59, intelectuais do mundo deram apoio logístico e de mídia a Fidel e Che, para instalar a mais longa ditadura da América Latina. De Paris, um filósofo feio, baixinho e confuso veio dar seu aval ao tirano do Caribe. Uma foto da época é das mais emblemáticas: Sartre, de pescoço espichado para o alto, adorando Castro como um Deus. Em La Lune et le Caudillo (Gallimard, 1989), Jeannine Verdès Leroux nos relembra este momento de extraordinária poesia.
- Todos os homens têm direito a tudo que eles pedem - pontifica Castro. - E se eles pedem a lua? - pergunta Sartre. O ditador retoma seu charuto e se volta para o filósofo baixinho: - Se eles pedem a lua, é porque têm necessidade dela.
Pediam a lua no bestunto do ditador e do filósofo. Em verdade, os cubanos queriam dólares, pão e liberdade. Da mesma forma que a Espanha, em 36, foi um campo de treinamento para a Segunda Guerra, a América Latina era laboratório de experimentos sociais para os filosofadores europeus que, no dizer de Camus, assestavam suas poltronas no sentido da História.
Também dos salões de Paris vinha o apoio teórico a Che Guevara e seus celerados, através de Régis Debray, mais tarde ministro de Mitterrand. Che morreu em odor de santidade e hoje é cultuado na Bolívia, como San Ernesto de la Higuera. Danielle Mitterrand, a viúva enamorada pela figura romântica do guerrillero, deu apoio a guerrilha zapatista em Chiapas, comandada por um agitprop branco travestido de líder indígena, o subcomandante Marcos. A mulher de Debray criou a biografia fictícia da guatemalteca Rigoberta Menchú, embuste que mereceu o prêmio Nobel da Paz de 92.
Nos anos 60, os comunistas que tentaram reeditar no Brasil a Intentona de 35, foram treinados na China, União Soviética, Argélia ... e Cuba. Fracassados e escorraçados em 64, os sobreviventes migraram ao Chile para assessorar Allende e ao Uruguai para dar apoio aos tupamaros. De Cuba, vinha o brado de guerra: "un, dos, tres, mil Vietnãs". O mito da revolução cubana inspira até hoje os homens que detém o poder no Brasil, entre eles Lula, José Dirceu e Tarso Genro, que adoram posar abraçados ao mais antigo ditador da América Latina. Claro está que Dona Dilma tampouco jamais dirá qualquer palavra contra o administrador da Disneylândia das esquerdas. Muito menos morena Marina ou Serra. Político algum no Brasil que queira eleger-se ousa criticar Castro.
Conheço não poucos cubanófilos em meu entorno. Em geral, assistentes sociais. Assistente social, por definição, é petista. (Você nunca vai encontrar uma assistente social que não defenda Lula). E, lá no fundo, comunista. Claro que jamais leram Marx ou Lênin e muitas vezes nem sabem o que seja comunismo. Mas defendem todas as idéias que Cuba ou a finada União Soviética defendiam. Nosso mundinho está cheio de comunistas que sequer sabem que o são.
Se você conversar com qualquer destes cubanófilos, mesmo os que jamais estiveram na ilha, eles afirmarão com a convicção dos justos que Castro resolveu os grandes problemas de qualquer sociedade, saúde, alimentação e educação. Pior ainda. Mesmo os que lá estiveram dirão a mesma coisa. Visitam os hotéis e restaurantes de Varadero, onde cubano não pode entrar, e hospitais diplomáticos, onde algum cuidado existe pela saúde. Cuba é então um paraíso.
Falar nisso, lembrei uma antiga historinha. Uma galinha surge nas ruas de Havana e é perseguida por um bando de cubanos famintos. A galinha descobre um bueiro e nele se esconde. Em seguida, um ovo surge rolando na esquina e é logo perseguido. A galinha o chama para seu esconderijo. Aparece então na calçada um filé. Antevendo o perigo, a galinha e o ovo chamam o filé para o esconderijo. Mas o filé, sem se apressar, responde calmamente: "não se preocupem, não há nenhum problema. A mim, eles não reconhecem mais".
É sabido, desde há muito, que os cubanos viviam em regime de fome, com os alimentos racionados por “la libreta”, enquanto Castro se dava ao luxo de mandar soldados para a África e exportar sua "revolução" para a América Latina. Com todo seu messianismo, o Líder Máximo não conseguiu livrar seu feudo da fase da monocultura. Cuba, durante décadas, só subsistiu graças aos cinco bilhões de dólares anuais fornecidos por Moscou. Trocados por açúcar vendido por preço acima da cotação de mercado. Morta a União Soviética, Cuba começa a morrer.
Por outro lado, só crentes podem acreditar que em um país faminto alguém possa gozar de boa saúde. Da mesma forma, haja fé para crer que em um país com um só jornal alfabetização adiante alguma coisa. É espantoso constatar como um país – hoje o mais pobre do continente depois do Haiti – ainda seja bandeira dos velhos comunistas do Brasil.
Leio nos jornais que o decrépito ditador, em entrevista a Jeffrey Goldberg, articulista da revista Atlantic Monthly, admitiu que o modelo econômico de Cuba não funciona mais. “Nem para nós”. Foi preciso mais de meio século para que Castro admitisse seu fracasso. Admitiu ainda sua grossa mancada durante a chamada Crise dos Mísseis, em 1962, quando aceitou a instalação de ogivas nucleares soviéticas na ilha e tentou convencer Moscou a atacar os EUA. Na entrevista a Goldberg, disse que aquele impasse "não valeu nada a pena".
Longa é a jornada de um comunista até o entendimento. Castro já não acredita nem em si mesmo. Quando seus seguidores deixarão de acreditar nele?
Mas nem tudo está perdido. Quando o infame Fidel trai seu próprio regime, ergue-se no Brasil uma voz mais castrista que a de Castro. Os órfãos de Havana ainda têm um ombro amigo junto ao qual consolar-se. Leio na Folha de São Paulo que, ao ser informado da declaração de Fidel Castro de que o modelo cubano está superado, o arquiteto Oscar Niemeyer, 102, um dos artistas brasileiros mais radicais na defesa do comunismo, disse não acreditar. A informação foi dada à Folha pela mulher dele, Vera Lúcia. "Quando comentei com ele sobre isso, disse que não acreditava."
O mesmo ocorreu dia 05 de março de 1953, quando morreu Stalin. Intrigas da CIA, repetiram os devotos. Stalin não pode estar morto. Porque um Deus não pode morrer. Conheci em Porto Alegre velhos comunossauros que choraram na época, indignados com as mentiras dos serviços de informação ianques.
O mesmo aconteceu em 1949, quando Victor Kravchenko denunciou em Paris os crimes de Stalin. Alto funcionário soviético que havia trocado a URSS pelos Estados Unidos, relatou esta opção em Eu escolhi a liberdade, livro em que denunciava a miséria generalizada e os gulags do regime stalinista. O livro foi traduzido ao francês em 1947 e teve um sucesso fulminante. A revista Les Lettres Françaises publicou três artigos difamando Kravchenko, apresentando-o como um pequeno funcionário russo recrutado pelos serviços secretos americanos. Kravchenko processou a revista, no que foi considerado, na época, o julgamento do século. No banco dos réus estava nada menos que a Revolução Comunista.
Em seu testemunho, Kravchenko trouxe ao tribunal Margaret Buber-Neumann, mulher do dirigente comunista alemão Heinz Neumann, como também o ex-guerrilheiro antifranquista El Campesino, ambos aprisionados por Stalin em campos de concentração. Kravchenko, que perdeu toda sua fortuna produzindo provas no processo, teve ganho de causa. Recebeu da revista francesa, como indenização por danos e perdas ... um franco simbólico.
A história de Kravchenko é fascinante, envolve diversos países, desde a finada União Soviética até Estados Unidos, França, Alemanha, Espanha, e até hoje não houve cineasta que ousasse transpor sua odisséia para as telas. Seu livro rendeu-lhe boa fortuna. Levado à falência com os custos do processo, foi morar no Peru, onde investiu em minas de ouro e de novo enriqueceu. Acabou suicidando-se em um hotel em Nova York. A partir de seu processo ninguém mais podia negar o universo concentracionário soviético. 1949 é a data limite para um homem que se pretenda honesto abandonar o marxismo. Sessenta anos depois, Niemeyer continua stalinista convicto.
Niemeyer não acredita que Castro tenha proferido tal bobagem. Provavelmente nem o Ariano Suassuna. Muito menos Zuenir Ventura ou Chico Buarque. Seria interessante ouvirmos a opinião de Luis Fernando Verissimo. Castro é um canalha. Devia estar na mesma prisão dos dissidentes que enviou à prisão por afirmarem que o regime cubano não funcionava mais.
O tempora! O mores! Não se pode confiar em mais ninguém. Ainda bem que Niemeyer resiste.
- Minha idéia – continuou o tiranete – como todo o mundo conhece, é que o capitalismo já não serve para os Estados Unidos, nem para o mundo, ao qual conduz de crise em crise, que são cada vez mais graves, globais e repetidas, das quais não consegue escapar.
Ah bom! Não falava do socialismo. Quando disse que o modelo cubano não serve nem mesmo para Cuba, não queria dizer que o modelo cubano não serve nem mesmo para Cuba. Pura interpretação do jornalista. O que queria dizer era que o capitalismo não serve nem mais para os Estados Unidos. Hugo Chávez, Chico Buarque, Ariano Suassuna, Luis Fernando Verissimo, Lula, dona Dilma, Marco Aurélio Garcia, Celso Amorim e Tarso Genro podem respirar aliviados. A utopia continua viva. Niemeyer, o decano do stalinismo no continente, tinha razão. Castro não poderia ter dito tal bobagem.
Só não deve ter convencido os cubanos, que há meio século sabem que o regime cubano não serve para Cuba. (Do Blog do
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