segunda-feira, 7 de março de 2011

O MONSTRO DA CHINA, SEM RIVAIS

MICHIKO KAKUTANI: 21 de outubro de 2005
Tradução: Dextra


Virou moda olhar Hitler e Stálin como os monstros gêmeos da história do século 20. Volumes inteiros (como "Hitler and Stalin: Parallel Lives", de Alan Bullock, e "The Dictators: Hitler's Germany, Stalin's Russia", de Richard Overy) examinaram estes dois tiranos através das lentes da escola comparativa/contrastiva da pesquisa historiográfica e muita tinta já foi derramada debatendo-se qual deles foi pior -- se bem que tais debates parecem deslocados e até ofensivos, dado o fato de que os dois homens foram responsáveis pela morte de milhões de pessoas.

Em seu novo livro, "Mao: The Unknown Story," [Mao: A história desconhecida] Jung Chang e Jon Halliday reivindicam apaixonadamente para Mao Zedong o título de tirano mais monstruoso de todos os tempos. Eles sustentam que ele foi o responsável por "mais de 70 milhões de mortes em tempo de paz, mais do que qualquer outro líder do século 20," e também que "ele foi mais extremo que Hitler ou Stálin" no sentido de ter planejado uma sociedade radicalmente idiotizada, completamente árida, vazia de civilização, destituída da representação de sentimentos humanos, povoada por um gado sem nenhuma sensibilidade, que obedeceria automaticamente às suas ordens." (Nota do Tradutor: poucas pessoas percebem que 1) Maomé é o maior assassino em massa da história, com mais de 270 milhões de mortes nas costas, vítimas do culto charlatão ele que inventou; 2) a sociedade que ele tinha em mente é exatamente igual a esta aí, mas em escala planetária e eterna, não local e temporária, com a de Mao. Pergunta: quem foi mais monstro?)

A sra. Chang, autora de "Wild Swans" [Cisnes selvagens], um volume de memórias que virou um best-seller registrando os sofrimentos de sua família sob o regime de Mao, e seu marido, o sr. Halliday, um historiador britânico, se basearam em materiais recentemente disponibilizados pelos arquivos secretos chineses e soviéticos e entrevistaram centenas de pessoas, incluindo-se pessoas da intimidade de Mao, colegas e vítimas suas. Seu alentado livro (embora talvez tendencioso e uni-dimensional) contém uma pletora de novas e valiosas informações que ajudam a passar a limpo o currículo de devastação legado por este tirano hediondo.

O livro demonstra o quão brutal e calculista Mao foi em sua ascenção ao poder, delineia o papel central que ele desempenhou em fomentar a Guerra da Coréia e revela o grau imenso em que ele era dependente de Stálin, tanto em sua chegada ao poder quanto em sua tentativa de tornar a China em uma superpotência nuclear. Os autores escrevem que "perto de 38 milhões de pessoas morreram de desnutrição e exaustão" durante o Grande Salto avante e em uma fome concomitante. Isto, sustentam eles, não foi resultado de má-gestão econômica, mas de frio cálculo político. Eles também sustentam, além disto, que Mao lançou sua mortífera Revolução Cultural como um meio de expurgar os líderes (como seu No. 2, Liu Shao-chi) que haviam ousado questionar suas catastróficas políticas do Grande Salto Avante.

Seu livro não só demole muitos dos mitos que Mao costruiu sobre si mesmo -- mitos em que um monte de ocidentais acreditaram, indo de Simone de Beauvoir a Henry Kissinger e Richard Nixon -- mas também oferece um retrato muito mais devastador do líder chinês do que os traçados por biógrafos recentes como Phillip Short e Jonathan Spence.

Autores anteriores registram muitas das atrocidades cometidas por Mao, mas ao mesmo tempo tendem a dar crédito a suas habilidades políticas e militares e seu papel em ajudar a colocar a nação mais populosa da Terra no caminho da modernidade. Com o sr. e a sra. Halliday, não nada disto. Eles atribuem a maioria das vitórias militares e políticas de Mao à sorte; à intervenção oportuna nos assuntos chineses por parte da União Soviética, Japão ou Estados Unidos; e às rédeas soltas por parte de Mao no uso do terror para esmagar a oposição e a dissidência.

Eles escrevem que Mao viu a Guerra Sino-Japonesa como uma oportunidade de ver Chiang Kai-shek ser destruído pelos japoneses e na verdade esperava que os soviéticos repartissem a China com o Japão, dando aos comunistas o controle de metade do país. Além disto, eles investem contra o mito heróico da Longa Marcha, argumentando que Mao e seus homens só sobreviveram porque Chiang permitiu que o Exército Vermelho escapasse.

Ao mesmo tempo, os autores declaram que Mao não possuia um "compromisso sincero" com o Marxismo, nem era movido por idealismo ou crença apaixonada, mas por uma busca pura e crua pelo poder. Eles escrevem que ele possuia um desprezo extremo por seus compatriotas chineses e que "não há sinais de que Mao tivesse quaisquer preocupações sociais derivadas de suas raízes camponesas e muito menos que ele fosse motivado por um senso de injustiça." Com a idade de 24 anos, dizem eles, ele escreveu uma séria de afirmações que revelam o egoísmo puro no cerne de sua filosofia: "Eu não concordo com a opinião de que, para ser moral, o motivo da ação de alguém tenha que ser benefício dos outros. A moralidade não tem que ser definida em relação aos outros." E: "Há quem diga que temos uma responsabilidade com a História. Não acredito nisto. Só estou preocupado em desenvolver a mim mesmo."

Nesta obra, a megalomania e o sadismo de Mao são postos a nu por uma enfiada de eventos apavorantes. Vemos o expurgo vingativo de Mao a seus companheiros e possíveis rivais e sua absoluta indiferença às pessoas que governava: "Estamos preparados para sacrificarmos 300 milhões de chineses pela vitória da revolução mundial," disse ele em 1957. Também somos testemunhas de seu apoio ardente à bomba nuclear como um veículo para o caos e a morte -- um de seus poemas diz: "A bomba atômica explode quando lhe mandam/ Oh, infinita alegria!" -- e sua destruição cega da cultura e tradições chinesas durante a Revolução Cultural.

O uso feito por Mao do terror se baseou em transformar os cidadãos em informantes uns contra os outros (filhos contra os pais, alunos contra os professores, vizinhos contra vizinhos) e em sua vida pessoal ele era igualmente frio e impiedoso. Ele abandonou altivamente sucessivas esposas e filhos e tratou até seus mais próximos associados com crueldade chocante. Ele fez seu ministro de longa data Chou En-lai -- que os autores descrevem com o poodle auto-degradante do ditador -- esperar dois anos, após o diagnóstico inicial, até fazer sua cirurgia de câncer: em parte, sustentam os autores, para ter poder sobre Chou e em parte para garantir que Chou estaria disponível para trabalhar em tempo integral com os chefes de Estado estrangeiros que estavam loucos para virem a Peking no rastro da visita do presidente Nixon.

Um dos problemas com esta obra é que o sr. e a sra. Halliday oferecem poucas análises sobre o comportamento de Mao. Há poucas pistas sobre os desafios da infância e adolescência (fora ter tido um pai de quem não gostava) que poderiam ter moldado sua psique patológica, nenhuma avaliação de filósofos (como, digamos, Nietzsche ou Maquiavel) que poderiam ter influenciado sua filosofia, nenhuma análise dos escritos da maturidade do ditador que poderiam lançar luzes sobre sua política ou seus valores.

Os autores também oferecem uma escassa contextualização histórica da ascenção de Mao. Eles não põe sua matéria em perspectiva com a tradição imperial da China, nem examinam as circunstâncias sociais e históricas que ajudaram a tornar o país suscetível a sua chegada ao poder ou seu governo maligno. Para piorar as coisas, eles por vezes fazem generalizações grosseiras que não podem ser provadas. Por exemplo: eles escrevem que durante a Revolução Cultural, quando os estudantes eram exortados a partirem para cima dos professores, "não houve uma só escola em toda a China em que não tivessem ocorrido atrocidades."

Afirmações tão questionáveis minam o propósito dos autores e são totalmente gratuitas. Os crimes de Mao contra a humanidade, documentados neste volume e em outras partes, são tão hediondos e incomensuráveis que não precisam de espalhafato.
***

Outra resenha sobre o livro no NYT; resenha do Guardian.

Nenhum comentário: