segunda-feira, 5 de março de 2012

COAÇÃO CONTRA A GAZETA, A LIBERDADE AMEAÇADA

A liberdade tida sem que seja uma desejada conquista, não será devidamente cultivada-(Gudé).
Por José Eugênio Maciel
“Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada;
quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores;
quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais do que pelo
 trabalho, e que as leis não nos  protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que
 estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensa
 a honestidade se converte em autossacrifício; então poderá afirmar
 sem temor de errar que sua sociedade está condenada”
El Universo – Editorial do Jornal equatoriano

            O Jornal Gazeta do Centro Oeste era para estar fechado. A última vez que ele circularia seria  no ano passado, dia 20 de setembro. Acabar com o Jornal é a intenção da Prefeitura do Município de Campo Mourão, vontade ávida manifesta por intermédio da procuradoria, conforme ação ajuizada contra a Gazeta.
         A coação surpreende e ao mesmo tempo deixa de ser surpresa. Surpreende por existir, sem embargo, um despreparo para conviver com a democracia, cujo pressuposto inarredável é a liberdade. A expressão aberta e portanto livre é assegurada em nossa Constituição Federal. Não chega a surpreender também em razão de outro despreparo que se soma, o de não aceitar ou conviver com o pensamento plural, diverso.
         Agir e responder com coação é uma forma de violência, e é este o propósito da Prefeitura de Campo Mourão, tudo por causa de uma manchete do Jornal publicada nos dias 17/18 de setembro do ano passado, com o título:”Ação do MP cancela licitação da Prefeitura”. Naquela edição foi noticiado que a promotoria de justiça questionara a administração municipal ao pretender contratar uma empresa para realizar serviços técnicos de prestação de contas ao Tribunal de Contas do Estado. A alegação da promotoria foi no sentido que o poder público deve dispor de servidores concursados para realizaram tal tarefa.
         Ao ingressar com a Ação, na qual pediu a imediata suspensão da circulação do Jornal, alegando que a noticia pretensamente ensejadora de lesão a moral, o Poder Público de Campo Mourão fragilmente apontou que a Gazeta teria agido de má-fé, “insinuações criminosas como verdadeiras o que causam grande prejuízo a imagem da administração pública”.
         A coercitividade almejada com a Ação é intimidatória, violenta, reflete a insana vontade de abusar do poder como se ele fosse teocrático, unilateral, a vontade de um governante não pudesse ser contrariada, não importa o que preceitua qualquer princípio ou lei.
         A coação fica evidente com maior propósito, e não o de reparar qualquer suposto dano à administração, é que a prefeitura não solicitou o direito de resposta “proporcional ao agravo”, no caso encaminhando para ser publicado uma nota oficial da prefeitura contestando a notícia. O direito de resposta pode ser feito diretamente ao Jornal ou em juízo, caso não tenha sido dada à publicação da resposta. O objetivo foi mesmo o de, truculentamente, fechar o Jornal, calar a voz expressa impressa que trouxe uma informação, sem fazer juízo de valor. Aliás, ainda que sinteticamente, é de se perguntar, a prefeitura de Campo Mourão já não esteve às voltas com muitos outros questionamentos de processos licitatórios que geraram discussões acaloradas e até suspensão deles? Jamais a prefeitura foi contestada?
         A coação almejada alucinadamente não produziu os efeitos requeridos, pois, afinal, o Jornal continua aberto, a Gazeta do Centro Oeste, prossegue com a circulação, como faz desde a sua fundação, a 28 de março de 1982. Sem se acovardar e consciente do embate que enfrenta, o Jornal estampou na edição de outubro (dia 28) a manchete: “Prefeito de Campo Mourão quer calar esta GAZETA”, oportunidade em que relata veicula uma peça publicitária muito oportuna, a dizer: “Sem liberdade, a verdade não aparece”.
         De fato, se a prefeitura estivesse segura dos seus atos e fosse madura para a democracia, se manifestaria no plano da liberdade de expressão, da crítica que o poder público deve, mais do que tudo, ser e ter, pois querer calar a voz é evidenciar a incapacidade de poder, saber e de fato responder ao mérito do que está sendo questionado, - não pelo Jornal – mas pelo Ministério Público. Neste sentido a virulência perpetrada contra o Jornal é um prevalecimento, pois talvez ao promotor não tenha ocorrido uma resposta assim contundente como ao dirigido ao Jornal via requerimento judicial pretendido.
         Agora é a Gazeta do Centro Oeste que é ameaçada na liberdade de informar e poderíamos, em relação aos demais meios de comunicação mourãoenses e da região, considerar ser um problema exclusivamente daquele Jornal. Entretanto, a mesma prática intimidatória ou algo do gênero poderá amanhã voltar-se para qualquer outro veículo ou pessoa, sempre que a vontade do prefeito seja contrariada, que seus atos, que devem ser públicos, sejam objetos de questionamentos. “É próprio das censuras violentas tornar credíveis as opinião que elas atacam”, escreveu Paul Valéry.
         A Gazeta continua circulando, prestes a completar 30 anos este mês. Mas não se trata da vontade de seus proprietários Aroldo Tissot e Sônia Sekscinski, eles que já sofreram violência física grave em outros tempos, e também não se curvaram, continuam por ter entendido a Justiça inicialmente não convencida do que foi alegado, negando, portanto, a concessão da tutela pleiteada.
         A liberdade é algo que ainda falta a todos no mundo, o Brasil caminha neste sentido, ora firmemente, por vezes a passos trôpegos e ainda infelizmente tropeça e cai por conta de armadilhas como as que se colocam propositadamente. Proibir a livre manifestação é próprio das ditaduras de governos totalitários que já mandaram queimar livros e fechar jornais cabendo advertir o que escreveu Ralph Emerso, “cada livro queimado ilumina o mundo”.

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