quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

MILTOM LUIZ PEREIRA, DOUTOR DA MAIOR CAUSA, A JUSTIÇA DA NOSSA GENTE

“A glória deve ser conquistada; a honra, por sua vez, basta que seja perdida”.
Arthur Schopenhauer
Por José Eugênio Maciel

Dr. Miltom discursando, na Pça. São José (foto PVeiga)
            Em 1959 ele veio para advogar, tendo escolhido o interior do Paraná por considerar maior a possibilidade de ser promissora a carreira. Sempre um estudioso dedicado e notável do Direito, trouxe para Campo Mourão a família, uma máquina de escrever e a vontade incansável do labor. Em pouco tempo se afeiçoou ao lugar de uma maneira tal que parecia ter nascido aqui e era nítida a identidade mourãoense estabelecida entre o doutor Miltom Luiz Pereira e os moradores.
         Desde a sua chegada para morar e trabalhar, ele foi rapidamente amealhando amigos, os quais manteve laços tão fortes que se mantiveram vivamente estreitados ao longo da vida. As relações pessoais e profissionais, sempre exercidas com atenção, esmero e elegância, que ao mesmo tempo eram simples e fraternas, foram determinantes para que ele tomasse a decisão de disputar a prefeitura. O processo eleitoral começara com o favoritismo do adversário de conhecida e tradicional família, Trombini, o madeireiro e industrial Ivo Mário. Alem disso, o doutor Miltom residia há pouco tempo e talvez lhe faltasse experiência político-eleitoral. A vitória foi indiscutível, o jovem advogado venceu o pleito com 6.034 votos e Ivo Trombini recebeu 3.130 sufrágios. Antes de assumir o cargo em dezembro de 1963, cabe registrar um gesto raríssimo em termos da política atual. O doutor Miltom foi a residência do então adversário das eleições para dizer que gostaria de contar com Ivo para administrar Campo Mourão, oportunidade em que Trombini foi elogiado pelas qualidades e o modo como se deu a disputa, embora intensa, pautada pelo respeito.
         Ainda tangente aquelas eleições, existe um fator primordial que empolgou o eleitorado, a oratória do doutor Miltom. Os discursos dele sempre foram verdadeiras peças de oratória, repletas de brilho, verve que combinava razão e emoção. Em qualquer das ocasiões, pouco antes de iniciar a fala, o silêncio dos presentes se fazia em sinal de respeito, interesse e satisfação. A rica cultura jurídica e  humanística eram a base, somada à criatividade de ilustrar com fatos históricos, enaltecimentos das pessoas os quais era exímio nos elogios eloquentes e sinceros. A dicção e o timbre de voz eram claros e que permitiam a fluidez da palavra manifesta com as ênfases, ponderações necessárias, dando rítimo certo. Era um líder político e a oratória tantas vezes foi capaz de análises e diagnósticos coerentes e lúcidos, assim como de chamamento voltado para mobilizar a coletividade e sempre a almejar o desenvolvimento de Campo Mourão. Em várias oportunidades, muitas décadas depois, ao vistar a nossa cidade, muitos faziam questão de comparecer para rever o amigo e também com o interesse de ouvi-lo ao usar da palavra, numa rememoração extraordinariamente tão histórica quanto atual.       
         Sem comparar ou desmerecer as gestões municipais anteriores, o doutor Miltom desde o começo propôs  uma transformação total que se caracterizasse efetivamente por um novo e moderno modelo de gestão pública, era urgente e inadiável acelerar o processo desenvolvimentista. E cabia a própria prefeitura dar o exemplo, e ela o fez com a construção da praça São José e a rodoviária, espaços e equipamentos modernos, funcionais e arquitetonicamente belos para época e mesmo para os padrões atuais, especialmente o prédio que foi estação e que hoje abriga a Biblioteca Professor Egyidio Martello. “Conversei com as irmãs para que elas construíssem um novo Instituto, pois aquele grande casarão no centro da cidade estava ultrapassado, ainda mais com a nova rodoviária”, disse-me ao se referir ao hoje Colégio Santa Cruz. “Criamos um meio eficiente e justo de controle orçamentário e de cobrança de impostos e taxas, fui obrigado a aumentar os impostos para fazer frente às obras que pretendíamos realizar”, lembrou também o ex-prefeito.
         Durante o tempo em que foi prefeito manteve um relacionamento direto com o povo, e ficou marcado o fato de, todas as semanas, o doutor Miltom comparecia à pioneira Rádio Difusora Colmeia quando prestava contas da Administração, mencionando valores, informando das obras e serviços prestados.
         Fora de qualquer dúvida, qualquer que seja a lista que se elabore enumerando os considerados melhores prefeitos, sem dúvida que em todas elas o nome do doutor Miltom irá constar, dada à projeção que teve Campo Mourão, tendo recebido importante título em 1966, como “Município Modelo”.
         Convém salientar que Campo Mourão sempre ficou plenamente associada ao doutor Miltom, que por sua vez, sempre fez questão de salientar o fato de ter administrado o Município, bem como afirmava com incontida alegria os muitos amigos que ele prazerosamente soube cativar. A propósito, quando ele era ministro do Superior Tribunal de Justiça, estive em Brasília e aproveitei a ocasião para visitá-lo. Naturalmente que tive que me identificar e no gabinete dele a secretária me fez várias perguntas do tipo o que eu queria com ele e quem eu era. Ao respondê-la que era apenas uma rápida visita, frisei que eu era o filho do “seu” Eloy Maciel e da dona Elza, “lá de Campo Mourão”. Foi então que ele próprio abriu a porta após a secretária avisá-lo e veio me receber. Pude perceber o grande carinho pela nossa cidade e também pelos meus saudosos pais. O doutor Miltom perguntou se eu precisava de alguma coisa e se poderíamos jantar ou almoçar. Informei a ele que logo mais eu embarcaria de volta ao Paraná.
         Orador brilhante, estudioso do direito, professor, a magistratura era praticada por ele com zelo, denodo e profunda sapiência ao julgar. De juiz federal chegou a ministro do STJ pelo notório saber, sabatinado pelo Congresso Nacional recebeu elogios. Sem dúvida, no meio jurídico até se aposentar compulsoriamente e antes como administrador, ele levou e elevou o nome de Campo Mourão, sempre com carinho, respeito e profunda ligação que manteve mesmo não morando mais aqui.
         O “fusca” é a história mais conhecida e a mais bela da vida dele e como parte importante da nossa história mourãoense. O carro simboliza a gratidão em sentido duplo. Foi iniciativa da população em presenteá-lo com um wolskwagen zero quilômetro, cabendo salientar que muita gente humilde fez questão de colaborar, se modestamente em termos de valor monetário, mas com enorme sentimento de gratidão ao “grande” prefeito, o “doutor Miltom”, como se referiam a ele. Gratidão que é do povo e foi também a gratidão da vida toda dele, já que jamais se desfez do carro, “dentro dele é mágico, eu estou em Campo Mourão”.
         Homem honrado ante a sua querida família, decente em todas as suas atividades, visão humanística própria das pessoas que compreendiam os bons sentimentos da sua gente, ele conhecia o descortinar dos horizontes que não fossem apenas sonhos, mas, a começar pelo sonhar, o doutor Miltom agia de modo a edificar um novo tempo que até parecia muito distantes a ponto de ser inalcançável, mas que se tornava presente, perene, verdadeiro. Humilde, falava com conhecimento de causa porque sabia ouvir, refletia, tomava decisões sem se arredar da ética, do espírito público e da justiça, foi sempre por tal motivo que o povo o chamava de doutor, com orgulho, respeito.
          Com o sentimento de eterna gratidão,  Adeus, doutor Miltom.

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