Foto: Júlio Fernandes/MDS |
Estão roubando as verbas públicas das escolas. Concentre-se nisso. Esqueça todo o resto, inclusive a crise que vem da Europa e dos EUA.
O dinheiro destinado ao financiamento da merenda e do transporte escolar das crianças brasileiras, que já é pouco, é diminuído pelos desvios.
Visto assim, isoladamente, o roubo dos recursos do ensino básico é apenas um escândalo. Converte-se em escárnio quando se descobre que o governo dá de ombros.
Os repórteres Roberto Maltchik e Fábio Fabrini informam: o Ministério da Educação avaliza as contas de municípios que malversam o dinheiro.
Acha pouco? Pois há mais: o ministério libera verbas novas para prefeituras que não comprovam a regularidade na aplicação do dinheiro velho.
Há pior: mesmo quando os malfeitos são detectados pela Controladoria-Geral da União, o MEC apõe o carimbo de aprovadas nas contas micadas.
Sim, caro leitor, em matéria de fiscalização de verbas educacionais, o governo ignora os desvios que o governo detecta.
O dinheiro saiu de uma arca chamada FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). As cifras alcançam a casa dos bilhões.
Entre 2005 e 2011, migraram dessa caixa brasiliense para os cofres de Estados e municípios R$ 15,28 bilhões.
O grosso, R$ 12,79 bilhões, foi destinado a um programa de alimentação escolar. O resto, R$ 2,49 bilhões financiou –ou deveria ter financiado— o transporte escolar.
As prestações de contas, quando apresentadas, entram numa fila que caminha em velocidade de tartaruga paraplégica.
Dos relatórios apresentados entre 2008 e 2009 sobre as verbas da merenda, menos de um terço mereceu a análise do MEC.
Dos documentos que se referem à aplicação das verbas de transporte, 90% ainda esperam por uma análise dos “gestores” federais.
A demora, por inaceitável, produz o inacreditável. Por exemplo: em setembro, a Polícia Federal prendeu o prefeito da cidade alagoana de Traipu.
Por quê? Descobriu-se que a prefeitura desviara R$ 8,2 milhões em verbas educacionais. Os desvios foram praticados entre 2007 e 2010.
Pois bem. Ainda que as prestações de contas de Traipu carregassem indícios dos malfeitos, o MEC não os teria farejado.
Em pleno ano 2011, a última conta de Traipu analisada pelo ministério refere-se ao longínquo exercício de 2006.
Por meio de nota, o FNDE disse que analisa a escrituração das prefeituras de duas maneiras.
Numa, leva em conta as informações que recebe dos conselhos constituídos nos municípios para fazer o “controle social” da aplicação dos recursos.
Noutra, perscruta os extratos bancários das contas abertas especificamente para movimentar as verbas liberadas por Brasília.
Tratado como panacéia pelo petismo, o tal “controle social”, exercido por pessoas da própria comunidade, resulta em fiscalização de fancaria.
Tome-se, por eloquente, o caso da cidade de Lagoa do Piauí. O time da CGU passou por lá. Detectou fraudes ba licitação de oito rotas de transporte escolar.
Supostamente apresentadas por empresas diferentes, as propostas continham os mesmos erros de português.
Transportavam-se alunos como se fossem animais, ora na carroceria de caminhões ora em ônibus precários, guiados por motoristas inabilitados.
Os conselheiros que faziam o “controle social” em Lagoa do Piauí limitavam-se a endossar os dados recebidos da prefeitura. Coisa usual no país, diz a CGU.
Afora o transporte inadequado, a criançada matriculada nas escolas da cidade piauiense ficou sem merenda em março.
Em março, as crianças matriculadas nas escolas da cidade ficaram sem merenda. Nos arquivos do MEC, as contas da alimentação estão catalogadas como “recebidas”.
A equipe da CGU esteve também na cidade de Presidente Sarney, assentada nos fundões do Maranhão.
Varejou as contas da merenda de 2007 (“aprovadas” pelo MEC) e de 2008 e 2009 (“recebidas”, de acordo com os registros do ministério).
Descobriram-se fraudes nas licitações. Verificou-se, de resto, que a comida da merenda era mal armazenada e preparada com água suja.
Retorne-se ao início: esqueça tudo. Pense só nisso: estão roubando as verbas das escolas. E o MEC brinca de “controle social”.
Escrito por Josias de Souza
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