domingo, 4 de julho de 2010

QUEM GOSTA DE INJUSTIÇA E DITADURA?


Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net

Por Jorge Serrão


O Brasil opera em regime de democradura institucional. Abundam injustiças. Direitos são violentados. José Anselmo dos Santos aguarda, ansiosamente, uma que seja cumprida uma decisão judicial para lhe conceder o elementar direito de ter uma carteira de identidade. O sergipano de Arraial D´ajuda continua um subcidadão por pura morosidade dos processos jurídicos tupiniquins. Ele é apenas um entre milhares de vítimas cotidianas do arbítrio orgânico do incompetente Estado tupiniquim
Marinheiro famoso das bagunças revolucionárias pré e pós-64, mais conhecido pela alcunha maldita de Cabo Anselmo, o cabra sequer teve direito à Lei de Anistia de 1979. Odiado pela esquerda, que o rotula de traidor porque se voltou contra a guerrilha armada, e desamparado pela direita, que não confia nele por ter conhecido como funciona uma máquina de repressão – Anselmo não tem seu processo julgado pela Comissão de Anistia. Motivo: os burocratas estatais exigem sua carteirinha de identidade - que o Estado nega. É o Cérbero correndo atrás do próprio rabo!
Tirando problemas jurídico-ideológicos de lado, temos outro exemplo de crime estatal sem castigo, que mostra como (mal) funciona a Justiça in Brazil. Uma motocicleta da Companhia de Engenharia de Tráfego, por ironia, responsável pelo trânsito de São Paulo, bateu na traseira do Fox da consultora de vinhos Kayo Nishimoto, de 39 anos. A regra é clara. Quem bate atrás é culpado. Há cinco meses a moça tenta que a CET pague os R$ 1.886 de prejuízo com o conserto do pára-choque e do porta-malas traseiros que ficaram amassados.
Se tivesse ocorrido o contrário - a motorista acertando a moto oficial por trás -, certamente, a mortífera máquina estatal moedora de gente (segundo o antropólogo Darcy Ribeiro) teria agido rigorosamente contra ela. Da mesma forma como os donos de quase 7 milhões de veículos em São Paulo são obrigados a se submeter à Inspeção Veicular Ambiental. Quem não se submeter a tal processo, fica impedido de licenciar o veículo. Coação injusta, mas perfeita.
O cidadão tem de pagar R$ 56,44 pelo serviço feito pela empresa Controlar – que pertence ao grupo CCR – o mesmo que fatura bilhões com nossos medievais pedágios. Tal inspeção, em breve, será obrigatória em todo o Brasil. A Controlar já se prepara para tal missão de “responsabilidade sócio-ambiental”. Quem não é de Sampa, veja como funciona o lucrativo negócio: http://www.controlar.com.br/. E prepare-se para ser “controlado”, em breve.
Voltando ao problema da cidadã Kayo Nishimoto, especialistas advertem que ela só terá seu prejuízo ressarcido se procurar as “vias judiciais” – que não são administradas pela empresa CET paulistana, mas que parecem cuidadas pelo douto saber de algum engenheiro de tráfego que comprou o diploma na democrática Cuba de Fidel Castro. Sorte (ou menos azar) de Nishimoto que o Tribunal de Justiça de São Paulo acaba de criar duas varas de Juizado Especial de Fazenda prontas para receber ações contra o Estado e o Município. Pouca gente sabe desta novidade.
Mas será que recorrer à Justiça resolve? No Brasil, parece que não. Até o presidente do Supremo Tribunal Federal admite tal problema. Em entrevista às páginas amarelas da revista Veja (edição 2172 de 7 de julho), Cezar Peluso reclama que existe um volume desnecessário de trabalho no sistema Judiciário. O caos é provocado por dois agentes: as grandes empresas, que desrespeitam o consumidor, e pela administração pública. Ambos apelam aos recursos judiciais “infinitos”, em vez de resolver suas pendengas com os cidadãos.
Assim, não temos Democracia – definida como a “segurança do Direito, através do exercício da razão Pública”. Por extensão, não temos República. O brasileiro é tratado como “coisa” e não como cidadão. É naturalmente injustiçado por um sistema que só beneficia o infrator – que ganha com o tempo (muitos anos) que as coisas demoram a ser julgadas. Enfim, não temos Justiça, apesar da dedicação de muitos profissionais do Direito – desde advogados, a serventuários e magistrados que trabalham, na maioria das vezes, em ritmo de enxugamento de gelo no escaldante deserto de legalidade.
A seleção privada da CBF voltou para casa. A campanha eleitoral deve começar, de verdade, a partir de segunda-feira. Infelizmente, a classe política continuará se lixando para o problema “legal” no Brasil. Deputados e Senadores formulam leis e aprovam as inventadas pelo Executivo, em última instância. A eles caberia encurtar o esquema judiciário tupiniquim, que permite, no mínimo, quatro instâncias de recursos, até que se chegue ao Supremo Tribunal Federal.
Nosso STF faz mágica de julgar 120 mil processos por ano. Só Deus, seus ministros e assessores técnicos sabem como! Vamos comparar nossa esdrúxula situação apenas com com os EUA. A constituição deles tem apenas sete artigos e 27 emendas. Os juízes da Suprema Corte norte-americana julgam, apenas, de 90 a 100 casos por ano. Azar nosso que temos uma carta magna mais de duzentos artigos e mais de 50 emendas. Os parlamentares teriam de tornar mais ágeis os Códigos de Processo Civil e Penal, que permitem os infindáveis recursos. Farão o dever de casa? Em ano eleitoral? É ruim...
Ou os segmentos esclarecidos da sociedade pressionam por mudanças pró-cidadania, ou continuaremos nas trevas judiciais por tempo indeterminado. Como o tema vai passar bem distante da agenda da apressada politicagem em campanha (pelo pleno emprego no Congresso), continuamos no enxugamento de gelo institucional.
Até quando agüentaremos sobreviver assim? A ditadura disfarçada do Estado vai durar para sempre no Brasil? Continuaremos coniventes com ela? Seremos eternos joguetes das “direitonas” e “esquerdonas” - dinossauros fundamentalistas que só pensam nos próprios interesses? Temos condições de agüentar tantas ideias e ideologias fora do lugar, sem soluções e propostas concretas para um projeto democrático de Nação?
Quem tiver coragem e vergonha na cara que responda sinceramente... Mas faça antes que Cérbero dê sua tríplice mordida final...

Jorge Serrão é Jornalista, Radialista, Publicitário e Professor. Editor-chefe do blog e podcast Alerta Total: www.alertatotal.net. Especialista em Política, Economia, Administração Pública e Assuntos Estratégicos.

Nenhum comentário: