sexta-feira, 26 de outubro de 2012

UMA CHANCE DE DIVERSÃO

Por Vinicius Oliveira  

Eu não sou o tipo de pessoa que tem o hábito de dizer coisas como "eu sou diferente" ou "só eu sou assim". Acredito, pelo contrário, que sou um tipo muito comum, e que o mundo esteja cheio de pessoas chatas como eu. Acredito também que, quanto mais uma pessoa insiste em suas diferenças, mais ela afirma o quão comum ela é.
Ninguém é diferente por ouvir Johnny Cash e estar rodeado de pessoas que só ouviram falar de Johnnie Walker; nem por saber que a Quinta Sinfonia é a quinta, e não nona. Suspeito que muita gente não saiba a diferença, mas ninguém é especial por sabê-la. E digo isso apenas para evitar a impressão de que eu esteja reclamando ao dizer o que direi, como alguém que se sente sozinho no mundo, como um alienígena que não é capaz de se sentir confortável próximo de humanos.
Pois é óbvio que o fato de a maioria de seus amigos não conhecer Chesterton ou Lewis não é motivo para se chatear com os seus amigos ou consigo mesmo. Há muitas pessoas no mundo que conhecem esses autores, e, mesmo que esse não fosse o caso, é sempre possível apresentá-los aos outros e esperar que disso surjam novas amizades.
A internet pode ser muito positiva nesse sentido, e para pessoas que acham divertido discutir as implicações do Pecado Original ou a ontologia do amor, a internet pode ser a praça que mesmo as cidades grandes não têm. A maioria dos meus amigos, quando se junta, não quer falar sobre essas coisas, e nem sequer pensa nessas coisas. E eu acho que é melhor que seja assim, pois não seria divertido discutir sobre esses assuntos a cada pequeno encontro, como é divertido discutir sobre música e as banalidades da vida pessoal. Além disso, para a minha sorte, alguns amigos meus nunca se importaram em discutir seriamente sobre religião ou filosofia.
Nem mesmo minha conversão foi um evento particular: meus dois melhores amigos se alistaram no exército cristão no mesmo dia em que eu me alistei - e hoje um deles me ajuda a levar esse modesto blog para frente. Isso é motivo de grande alegria para mim, justamente por ter sido uma alegria que eu podia compartilhar e que eles podiam entender.
Mas uma das maiores diversões da vida é o desafio, e para haver desafio é preciso haver desacordo: o desacordo entre a realidade como ela é e o ideal que se quer atingir. Obviamente, se você é cristão e deseja ver o mundo inteiro convertido é necessário ir ao encontro de quem ainda não abraçou o cristianismo. Por isso acredito, por mais estranho que isso possa parecer, que o ateísmo é uma oportunidade de divertir-se; uma chance única de aventurar-se; um desafio que todo cristão deveria encarar com um sorriso no rosto.
Quando um ateu diz um absurdo sobre a Igreja Católica ele nos dá uma irrecusável oportunidade de corrigi-lo. Pode ser muito frustrante ouvir algumas tolices que sabemos não ter o menor sentido, mas a frustração só será insuportável se a filosofia do amor aos inimigos for ignorada. E com isso não quero dizer que devemos aceitar tudo o que ouvimos como se toda a opinião fosse digna e merecesse algo além do desdém; pois é justamente quando há amor que sentimos um desejo inexplicável de corrigir o erro de quem amamos, ainda que isso exija uma mão firme ou mesmo dolorosa.
O que eu quero dizer é que, se a nossa filosofia nos adverte sobre pessoas tolas ou mesmo ingênuas que falarão contra a verdade todo o tipo de mentira, há a possibilidade viva de que entremos no campo de batalha com um sorriso no rosto, como um soldado que se lança ao meio de desconhecidos a fim de recrutar novos irmãos, em vez de transformar essa potencial irmandade em uma real arena de gladiadores - gladiadores que só deixarão suas armas quando seus inimigos estiverem no chão.
Ao escrever qualquer pequeno texto sobre o ateísmo, não fico pensando em escrever algo contra os ateus; na verdade gosto de pensar de que estou escrevendo algo a favor de ex-ateus, com uma vaga mas sincera esperança de que o que eu escrevo possa ajudar alguém a se interessar pelo exército em que eu sirvo, e talvez um dia se juntar a ele. Talvez se tratarmos os nossos inimigos como possíveis futuros companheiros de batalha, Deus nos recompensará com a espada da alegria: uma arma muito mais eficiente que qualquer ferro forjado pela amargura.
Se houver uma preocupação sincera, no sentido de prestar ajuda a quem precisa, todos os debates entre ateus e religiosos poderão terminar com um abraço, mas porque há, aparentemente, um cansaço e um descaso com a necessidade alheia, todos acabam sem nem mesmo um aperto de mãos. A paciência de nenhum ser humano é infinita, mas o que percebo é que muitas vezes não há mais qualquer esforço para ser paciente. As pessoas já estão cansadas antes mesmo de se mexerem, e justamente por isso qualquer simples caminhada tem levado à exaustão.
Para mim, se o bom humor é sacrificado, se a alegria é esquecida, e se não há um mínimo de prazer na discussão, nem que seja o prazer de descobrir o que o outro pensa, então, nada mais tem sentido. O debate sobre religião não leva a nada a partir do momento em que os adversários se portam como inimigos; e, insisto, pode ter muito sucesso se os adversários se portarem como irmãos, pois o afeto é possível entre as pessoas mais diferentes do mundo, assim como é possível entre espécies destinadas ao poético ódio mútuo e irreversível, como é o caso do gato e do cão.
Sinto como se estivesse reforçando ideias óbvias demais, mas a minha insistência é justamente pelo fato de a realidade ser bastante obscura. Tenho visto muitos cristãos impacientes demais e duros além do ponto da correção justa que brota do amor - e eu certamente não sou uma exceção. Mas eu espero que esses breves parágrafos resultem em reflexão, e que a oportunidade de corrigir os erros mais irritantes não seja levada como um duelo até a morte, mas como uma mera chance de diversão.
Publicado em:
Imagens da Internet 

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