Por João Bosco Leal
Tenho lido diversas citações sobre cicatrizes, de como invariavelmente são provocadas, ou mesmo adquiridas sem intenção, e que, depois de terem ocorrido, não somem mais, como aquela em que o pai, para demonstrar isso ao filho, deu-lhe um martelo e pregos, determinando que os pregasse em uma lata e depois os retirasse, de modo a que ele notasse que, mesmo depois de retirados os pregos, suas marcas lá ficaram e não sumiriam.
Queria esse pai mostrar ao filho, que tudo o que fizesse na vida teria consequencias, e que as feridas provocadas em alguém jamais seriam cicatrizadas.
Pensando sobre o assunto acabei percebendo como as cicatrizes ocorrem em nosso dia a dia, em variadas quantidades, profundidades ou extensões, e pelos mais diversos motivos.
As cicatrizes internas são provocadas por amigos, amores, pais ou filhos, e as físicas, provocadas por pequenas quedas ou mesmo aquelas provocadas por acidentes, de maior ou menor tamanho, mais ou menos traumático.
Quando as cicatrizes não são externas, aparentes, normalmente são as mais profundas e doloridas. São as cicatrizes da alma, do coração, provocadas por perdas irreparáveis, de grandes amizades, amores ou entes queridos, de maior ou menor presença diária em nossas vidas.
Existem também as cicatrizes físicas, externas, normalmente provocadas por acidentes ocorridos durante a nossa vida, desde pequenas quedas na infância, a grandes acidentes que podem ocorrer durante nossa existência, nos deixando marcas mais ou menos profundas, ou até mesmo provocar o nosso fim.
Envolvido nesses pensamentos, me lembrei de um conselho ouvido certa vez de uma sábia, já bem idosa, de que muitas vezes, ao notar que uma conversa poderia se tornar mais tensa deveríamos encher a boca de água e não a engolir, esperando o tempo passar, para depois, bem depois, engolir a água e retomar o assunto.
Era o tempo necessário para que a ira passasse, e, depois disso, poderíamos reiniciar a conversação com mais calma, sem as respostas imediatistas e iradas, e depois de calmamente já havermos pensado mais sobre o tema.
Com essa simples sugestão, da água na boca, ela me fez pensar na cena, e notar como realmente, durante a vida, fazemos besteiras e provocamos diversas cicatrizes, aqui representadas pela sujeira da água esparramada, por simplesmente não esperarmos algum tempo, e falarmos ainda com a boca cheia de água.
Percebo que, com a idade, e a consequente experiência de vida, podemos evitar tanto provocar, como adquirir cicatrizes, sejam as físicas ou as emocionais, e, dessa maneira, certamente passamos a viver muito mais e melhor. Procurando colocar água na boca, e assim não causar cicatrizes, nos tornamos mais agradáveis, menos debatedores, com mais facilidade de aceitação, e consequentemente de ser aceito.
Com a experiência acabamos também diminuindo nosso ritmo, nossa velocidade, e com isso passamos a correr menos riscos, emocionais ou físicos. E tendo mais tempo para as reações, com água na boca, provavelmente encontraremos outras alternativas, ou mesmo teremos mais tempo para frear, e desviar dos riscos.
Penso que muitas das cicatrizes, que possuo ou que provoquei, poderiam ter sido evitadas, ou mesmo deixado de existir, se estivesse com água na boca, ou se, na pressa de minha juventude, tivesse freado um pouco, e tido mais tempo para ouvir os mais velhos.
As cicatrizes aí estão para nos lembrar de como não fazer, de que o passado foi real, e de exemplo para aqueles que as conseguem ver.
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