Por Nivaldo Cordeiro
Desde que eu trabalhei na prefeitura de São Paulo, quando tive que interagir, por dever profissional, com os chefes da burocracia do trânsito, e isso já faz muito tempo (Governo Erundina), eu pude constatar como essa burocracia odeia os proprietários de automóveis, atribuindo a eles toda sorte de infortúnios que acontecem cotidianamente nas vias públicas e também por carregarem o pecado mortal de supostamente estarem no extrato superior da pirâmide de renda. Em suma, pensa ela ser os motoristas de automóveis gente rica, egoísta e irresponsável. Eu vi então como tentavam cercar e extorquir, no que podiam, os infaustos motoristas. Sua via principal sempre foi o Código Nacional de Trânsito e as legislações nele apoiadas nas diferentes esferas de poder. Um desses sujeitos de minha época de prefeitura acabou virando diretor do Contram no Governo Lula e conseguiu realizar seus sonhos de comissário disciplinador do trânsito.
O que vimos desde então? O abuso e a injustiça legal se acumulando paulatinamente sobre os donos de automóveis. Hoje o ato de dirigir tornou-se um grande perigo jurídico, de sorte que sair de casa e se envolver em algum acidente banal pode custar caro, até mesmo a liberdade. Beba uma garrafa de cerveja e perderá mais do que a carteira de habilitação, estará cometendo um crime – a rigor um pré-crime, um conceito bastante elástico. Ainda ontem, vindo do litoral, um amigo meu, rigoroso cumpridor de seus deveres e proprietário de carro novo, teve o veículo apreendido e ficou a pé na estrada, por conta de uma filigrana jurídica. Puro abuso de poder ou tentativa de extorsão malograda, que meu amigo nunca pagaria propina. É preciso reduzir o poder dos guardas de trânsito sobre os desprotegidos motoristas
Casualmente hoje o jornalista Marcelo Coelho publicou pertinente artigo na Folha de São Paulo sobre o assunto (Corrompa ou obedeça). O artigo tem mais méritos por colocar o tema do que por dissecá-lo bem. Sua conclusão é bisonha, ele que se esqueceu de cumprir a Inspeção Ambientar Veicular e está pagando caro por isso:
“Quase 200 anos depois da Independência, ainda temos do Estado uma visão colonial. Trata-se de uma entidade arrecadatória, nascida de algum reino estrangeiro que inventa novas coisas para nos infernizar e que cumpre enganar do mesmo modo com que nos tapeia. A corrosão ética da coisa toda nasce, a rigor, da política, e não o contrário: por se tratar de uma cidadania imperfeita, de um autoritarismo latente, de uma democracia sem participação e de um Estado, afinal, sem dono, mas com muitos gerentes e coronéis, é que corromper ou obedecer são as saídas que conhecemos. Não adianta reclamar depois”.
Invocar o Estado colonial para entender o que a burocracia de trânsito tem feito é não perceber que o Estado brasileiro foi tomado pelas hordas esquerdistas, no âmbito da revolução gramsciana, revolução esta que se encontra no seu apogeu. O Estado atual do Brasil não guarda mais nenhum elo com o amaldiçoado Estado colonial. Um dos lugares em que essa dita revolução alcançou plenitude foi junto à burocracia de trânsito, que vê no proprietário de automóvel o “burguês” caricato dos manuais de marxismo, que usa transporte particular – Oh, crime hediondo! – enquanto as massas usam o transporte público de má qualidade. Associado a isso colocaram, nos últimos tempos, a questão ambiental em destaque: além de burguês egoísta e bem acomodado no seu espaço personalíssimo, o motorista de automóvel é também um poluidor incorrigível do meio ambiente. Pau no burguês!
Marcelo Coelho, ao apelar para argumento do tipo “Estado colonial”, colaborou para esconder a origem e a natureza da maldição que desabou sobre os proprietários de automóveis, perseguidos impiedosamente pelas prefeituras e violentamente expropriados de sua renda, seja pelo mecanismo das multas abusivas, seja pelas exorbitantes e injustas taxas que são cobradas. E não podemos nos esquecer do abuso-mor dos pedágios, que seriam devidos se os impostos sobre os carros não tivessem como suposto destino a melhoria da malha viária.
Nem mesmo Marcelo Coelho, distinto membro da nomemklatura jornalística, fato que o torna um agente gramsciano graúdo, escapou de gritar contra os abusos e a injustiça. A velha história de que pimenta no olho do outro é refresco. A pimenta agora está caindo nos olhos de todos. Marcelo Coelho não percebeu onde está a origem de tudo: na edição das leis injustas, abusivas, preconceituosas, fundadas na falsa visão da luta de classes e do homem como praga do meio ambiente. Ele foi incapaz de ver o problema real, como se nota facilmente na leitura do seu artigo, que é a tomada do poder pelas hordas esquerdistas. Mas tem o mérito de ter usado seu espaço para protestar. Pena que sua cegueira ideológica tenha contribuído para desperdiçar o precioso espaço.Indicação de meu amigo Anatolly Oliynik - Imagem da Internet - fotoformatação (PVeiga).
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